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Chumbinho passou do limite? Filipinho deve arriscar a vida em Teahupoo?

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“A coragem, às vezes, é aceitar até onde se pode chegar.”

Domingo, 3 de dezembro. Recebo a notícia de que João “Chumbinho” Chianca quase perdeu a vida numa vaca para o Backdoor. Ele é um surfista preparado, audaz, mas jovem e sem tanta experiência numa onda que não tem a alcunha de Rainha do North Shore apenas pela sua perfeição. João está, ainda bem, estável, sem maiores sequelas segundo as informações recentes. Foi um susto, que certamente vai servir de alerta para novos confrontos com a natureza.

Pipeline (e sua direita cabeluda) é uma das ondas mais perigosas que existem. Por sua bancada rasa e irregular, com suas minis cavernas, e pela estupenda força que estoura quando seu lip chega ao destino. Um pico que desafia qualquer um quando está em condições extremas, inclusive os mais talentosos e atirados. Porém, não é sobre isso que quero dissertar.

Muitos de nós, da mídia, e muitos dos fãs dos surfistas brasileiros, acreditam que o êxito de seus ídolos tem que vir a qualquer preço, como se esses esportistas tivessem a responsabilidade de satisfazer a nossos anseios e frustrações. Pois nossos ídolos têm seus limites, sejam eles físicos ou mentais. E temos que aprender a respeitar isso.

Será que a cobrança para que Filipe Toledo se torne um ás em Teahupoo, por exemplo, não é um exagero sem sentido, para que nossas frustrações como brasileiros, num país tão complicado como o nosso e sujeito a baixa estima, seja esquecida pelo sucesso alheio?

Alguém perguntou se ele quer ser um expert numa onda onde basicamente todos tem pavor? Com uma família adorável, filhos com tanto a crescer ainda, Toledo tem o que a ganhar arriscando seu pescoço? O cara conseguiu ser bicampeão mundial sem ter resultados satisfatórios em ondas desse tipo, então para que tentar forçar uma situação em que ele não esteja à vontade?

Creio que a paixão pela adrenalina no seu mais alto grau é coisa para poucos. O Circuito Mundial organizado pela WSL é disputado em ondas variadas, mas com alguns picos podendo ser desafiadores. Só que uma competição não é como uma sessão livre. Quando rolam 30 minutos, vence aquele que somar mais pontos, e duas ondas 5,5 somam 11 e vencem quem surfa apenas uma nota 10. Em boa parte das vezes, a estratégia vence o talento. E tirando Gabriel Medina e John John Florence, não vejo mais ninguém entre os Tops capaz de demolir as cracas de Pipe e Teahupoo com a cobra fumando. Medina e Florence certamente são os surfistas mais completos do mundo. Chianca caminha na mesma direção. O acidente apenas vai fazer com que ele fique mais focado e tenha o respeito necessário para encarar os novos desafios.

O surf é um esporte que tem dois lados bem definidos. O que nos dá prazer e o que nos traz medo. E essas emocões não existem uma sem outra. As sensações gostosas, de sentir a adrenalina ao completar um drop, por exemplo em Pipe, ou um simples corte numa espuma no Canal de Santos, não podem ser comparadas. Ambos os sentimentos são particulares para cada surfista, seja ele um iniciante ou um profissional. Só que cada um no seu limite. A coragem, às vezes, é aceitar até onde se pode chegar. Ultrapassar a linha tênue que separa a ousadia da burrice é um erro que muitos cometem, pagando as vezes com a própria vida.

Alex Guaraná
Alex Guaraná
Carioca e flamenguista roxo, mandou sua primeira manobra na Barra da Tijuca, em 1980, aos 13 anos de idade. Após uma bem sucedida carreira de competidor amador, passou a atuar como jornalista especializado. Primeiro nos jornais Staff e Now. Na sequência, trabalhou com Ricardo Bocão e Antônio Ricardo no programa Realce, pioneiro em esportes de ação na TV brasileira. Após um período como dirigente, e outro como assessor de imprensa do Circuito Mundial no Brasil, assumiu o posto de editor-chefe da Revista Fluir, onde ficou até 2007. Desde então se tornou comentarista esporádico, e agora fixo aqui na Hardcore, do esporte que conhece como poucos.

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