26.2 C
Hale‘iwa
quinta-feira, 9 maio, 2024
26.2 C
Hale‘iwa
quinta-feira, 9 maio, 2024

Entendendo as lesões no quadril de Kelly Slater e Griffin Colapinto

-

Recebo muitos pacientes no consultório com queixa na coluna lombar, mas que ao investigarmos melhor, possuem uma causa no quadril.

Recentemente, Kelly Slater e Griffin Colapinto passaram por procedimentos cirúrgicos na região do quadril. Ambos descreveram em entrevistas que as lesões em questão eram devido ao labrum “rasgado”.

Segundo entrevista concedida a Kai Lenny, o GOAT lembra que há 32 anos sofreu um wipeout em Sunset e pensou que havia partido o fêmur. Alguns anos depois acabou lesionando novamente o quadril do Taiti e foi operado em 2000 (Kelly não dá detalhes da cirurgia, mas provavelmente passou por uma artroscopia do quadril). Logo após a vitória de Filipe Toledo no CT em 2023, Kelly deu os parabéns ao brasileiro e revelou que havia passado por um novo procedimento no quadril e estava em recuperação.

Durante a entrevista, ele ainda refere que desta vez não foi realizada apenas o reparo do labrum. “O Dr Warren Kramer disse que o labrum estava praticamente solto de um lado ao outro, havia diversos esporões no fêmur e muito tecido cicatricial. Foi utilizado o labrum de um cadáver, inseriram e ligaram ao meu osso”, relata Kelly.

Griffin Colapinto recentemente também postou em suas redes sociais uma foto com roupa cirúrgica dizendo que surfou a segunda metade de 2023 com o labrum rasgado do quadril direito. Griffin terminou o ano como Top 3 do mundo.

Afinal, o que é esse tal de labrum? Foi um problema devido as manobras avançadas que eles fazem?

Para explicar um pouco mais sobre essas lesões, precisamos entender a estrutura do quadril. A articulação é formada pelo encaixe entre o fêmur e o acetábulo (parte da bacia). O labrum é uma estrutura de fibrocartilagem que envolve a articulação quase que na sua totalidade. Além de aumentar a estabilidade, promove o que chamamos de propriocepção, ou seja, informa ao cérebro qual a posição que a articulação se encontra no espaço, sem necessitar olhar para ela.

O lábio acetabular (labrum) é uma estrutura altamente inervada e vascularizada (fig. 1), o que leva a um quadro de dor importante na região do quadril e torna-se de difícil cicatrização.

Figura 01.

A lesão do labrum geralmente ocorre devido a um impacto entre o fêmur e o acetábulo ao longo de anos, principalmente em pessoas que apresentam uma formação a mais de um osso (no fêmur ou no acetábulo) de nascença (fig. 2).

Figura 02

Ou seja, a articulação que é revestida por cartilagem, vai raspando no labrum, até o momento em que este pode se soltar, gerando assim dois problemas (a soltura do labrum e o desgaste da cartilagem). Nessa condição de lesão, podemos antecipar o que chamamos de artrose do quadril.

Uma cirurgia minimamente invasiva (artroscopia) irá ajudar a “raspar” este excesso de osso e a refazer o contorno do acetábulo, prendendo o labrum na sua origem e evitando o impacto. Com isso, podemos minimizar os riscos da evolução para artrose do quadril, com perda de mobilidade da articulação.

Se atentarmos às palavras do Kelly, ele já apresentava alguns esporões no fêmur, característico da artrose no quadril. Ou seja, o quadro de impacto femoroacetabular provavelmente evolui para uma artrose.

Os sintomas desse impacto são variáveis, desde dor no quadril, virilha até dores que podem acometer a coluna. Recebo muitos pacientes no consultório com queixa na coluna lombar, mas que ao investigarmos melhor, possuem uma causa no quadril.

O impacto femoroacetabular, por ser um problema anatômico de nascença, muitas vezes não pode ser tratado apenas com fortalecimento, biomecânica e fisioterapia. Devemos realizar a correção dessa anatomia com um procedimento cirúrgico chamado artroscopia do quadril.

Griffin Colapinto lesão
Griffin Colapinto revelou que competiu praticamente todo o ano sem saber da graviade de sua lesão. Foto: Reprodução Instagram

Durante esse procedimento, realizamos a raspagem do excesso de osso na região do fêmur, do acetábulo ou de ambos, além de corrigir o contorno do lábio acetabular com âncoras, evitando o impacto e prevenindo a progressão para artrose.

Logo após o procedimento, o paciente tem alta no mesmo dia da cirurgia e permanece com apoio de muletas por cerca de duas semanas. O inicio da fisioterapia é no mesmo dia da alta hospitalar, já iniciando bicicleta ergométrica. O retorno ao surf fica em torno de seis a nove meses após o procedimento.

Se você sente incomodo em algumas manobras do surf, no seu treino funcional,

ou simplesmente para ficar sentado na prancha no outside, procure um ortopedista que lhe faça um bom exame físico e te oriente quanto às possíveis causas.

 

 

 

Thiago Consentine
Thiago Consentine
Médico Ortopedista formado pela Santa Casa de São Paulo. Pós-graduado em Medicina do Exercício e do Esporte. Surfista há mais de 25 anos. Trabalha atualmente com a melhora da saúde e performance de atletas amadores e profissionais. Coautor do trabalho científico "perfil epidemiológico das lesões relacionadas ao surf em atletas do estado de São Paulo". Cirurgias minimamente invasivas de joelho e quadril. Teve suas núpcias quase cancelada quando disse à então noiva que iria surfar durante a viagem de casamento a Fernando de Noronha.

Compartilhar essa Reportagem

Adrian Kojin

Alex Guaraná

Allan Menache

Edinho Leite

Jair Bortoleto

Janaina Pedroso

Kelly platônico

Luciano Meneghello

Phill Rajzman

Zé Eduardo

Thiago Consentine

Gabriel Davi Pierin

Jaine Viudes

O surf de base livre