Comecei a surfar com quatro anos de idade e sempre gostei de todos os equipamentos, pranchinhas, longboards, entre outros. Lembro que desde criança já tinha interesse em saber como eram produzidas. Na época, patrocinado pelo pioneiro e embaixador do surf brasileiro, Rico de Souza, meu grande mestre, tive a oportunidade de entrar em uma sala de shape e fiquei ligado nos designs e outlines das pranchas que ele fazia para mim.
O ano de 2006 foi um divisor de águas, quando me aproximei da Hobie Surfboards, o que permitiu posteriormente inclusive a fabricação das pranchinhas, que até então eram feitas de madeira.
Modelos para todos os gostos e necessidades. Foto: Mário Nardy
A história foi a seguinte: nesse ano participei de um evento paralelo ao Circuito Mundial, promovido pela Hobie, na Costa Rica, na qual foram convidados os top 16 do mundo e todos competiam com mesmo equipamento de tecnologia inovadora, pranchas mais leves e resistentes, e com maior durabilidade (na época uma prancha na minha mão não chegava a durar dois meses, eram muitas competições e treinos).
Durante essa competição fiz um teste drive na prancha e fiquei apaixonado. Para minha sorte, venci o campeonato e recebi essa prancha como parte do prêmio. Após treinar bastante com esse equipamento fui para o Circuito Mundial, em 2007, e conquistei o primeiro título mundial para o Brasil. Fui também o primeiro campeão mundial usando uma Hobie. Isso abriu as portas da empresa e no mesmo ano fui contratado para fazer parte do time e começar a desenvolver pranchinhas e longboards na matriz da Hobie, na Califórnia/EUA.
Para se ter uma ideia da oportunidade única, quem me ensinou a shapear foi Terry Martin (1937/2012), um dos primeiros shapers do mundo e um dos grandes nomes. Tenho até hoje duas das dez pranchas que fizemos juntos (metade cada uma).
Com isso, cada vez mais foi me despertando a vontade de desenvolver equipamentos diferentes já que tinha acesso na Hobie a quase dois mil tipos, desde pranchas feitas totalmente de madeira até as mais modernas que existiam na época. Eu fazia testes drives e fui entendendo cada vez mais do assunto.
Em 2019, a Hobie foi vendida, mas havia aprendido na melhor escola, que me deu uma bagagem enorme para iniciar a minha produção, em 2019, no Brasil. Após um ano inaugurei a Phil Rajzman Shapes, que hoje fabrica todos os tipos de pranchas. A minha principal linha de produção, obviamente, são os longboards, onde criei modelos que variam dependendo das condições de onda. Cada modelo é definido pela cor, com uma incrível identidade visual.
. Blue Monkey e Yellow Monkey – pranchas mais clássicas
. Purple Monkey – pranchas híbridas, bem versáteis, permitem fazer o surf clássico e o moderno progressivo, sendo que oferece um pouco mais de característica do surf clássico, por ela ter sido inspirada na Blue Monkey.
. Orange Monkey – prancha totalmente progressiva, feita para fazer um surf moderno, um longboard, valorizando as manobras da rabeta, aéreos, que foram desenvolvidas pelas pranchinhas.
. Red Monkey – inspirada na Orange Monkey foi ajustada para se tornar uma prancha híbrida, permitindo o surfe clássico e moderno.
. Green Monkey – para ondas grandes, com ela fui vice-campeão, recentemente, do campeonato Tunel Crew Shootout
. Purple Blue (lançamento) – uma mistura da Blue Monkey e Purple Monkey, bem versátil para condições de ondas pequenas, possibilita bastante remada e flutuação, facilitando entrar nas ondas, e capacita mais o controle para trocas de borda, para um surf bem fluído.
Diferenciais do meu negócio
Acredito que o segredo do sucesso do meu empreendimento é o fato de eu fazer as pranchas e imediatamente ir testá-las e depois fazer ajustes. Surfo com elas duas a três vezes e revendo essas pranchas semi novas por um preço um pouco mais acessível que as pranchas novas. Por exemplo, a Red Monkey, que é o primeiro modelo que fabriquei (desenvolvo desde 2007) já mudou bastante. São pequenos ajustes e detalhes que, no final, fazem uma grande diferença na parte funcional dentro da água.
Eu fico super ansioso cada vez que uma prancha nova está saindo. Fico na expectativa do equipamento poder melhorar ainda mais e é uma evolução constante. Estou feliz em vivenciar esse momento da minha carreira.
Obviamente, o feedback dos atletas é essencial. E por eu ter sido atleta de elite do Circuito Mundial por 25 anos, troquei muitas informações que foram fundamentais para o desenvolvimento dos equipamentos, que seguem os critérios de julgamento do tour mundial. Aliás, muitas dessas pranchas são inovações que trago antecipadamente ao Brasil.
Outro diferencial da Phil Rajzman Shapes é que, além das produções tradicionais, que mantém as pranchas de poliuretano e epóxi, a marca também produz pranchas com o que existe de melhor em tecnologia no Brasil: as pranchas da Powerlight, de Florianópolis, que ao invés de ter uma longarina no meio, utiliza folha de madeira como laminação, permitindo uma prancha mais leve e resistente, sem perder a flexibilidade. A nossa parceria foi criada há mais de dois anos. Também tenho parceria antiga com a First Class, principal empresa de fabricação de pranchas do Rio de Janeiro, com a tecnologia tradicional de poliuretano e epóxi.
E as novidades não param mesmo. Recentemente iniciamos a fabricação com as pranchas Full Carbon, também em parceria com a Powerlight, tecnologia totalmente feita de fibra de carbono, que dá mais resistência. Sem dúvida, mais um dos grandes diferenciais da nossa fabricação de longboard no Brasil atualmente.
Nos últimos quatro anos, o negócio evoluiu muito e cada vez mais em uma crescente impressionante. Até agora já foram produzidas 500 pranchas, uma média de 125 por ano.
Ao fazer uma prancha com o Phil, o cliente se beneficia de um conhecimento profundo da arte de surfar. Foto: Mário Nardy
Trata-se de um mercado em expansão no Brasil e no mundo. Recebo vários pedidos de encomendas de diversas partes do País, mas principalmente de São Paulo, Florianópolis, Rio de Janeiro e do Nordeste (Bahia, Recife e Fortaleza). Em outros países comercializo pranchas para os Estados Unidos, onde temos representantes, e, também, na Europa, sobretudo Portugal. Tenho tido muita procura, ainda, na China, Coreia do Sul e Taiwan, onde participei de competições do Circuito Mundial. Sem contar a Austrália. Quer dizer, tenho pranchas que criei espalhadas por todo mundo.
Vale ressaltar que o mercado vai bem também porque o longboard é uma modalidade que cresce organicamente por oferecer a possibilidade de pessoas de todos os níveis de surf estarem dentro d’água se divertindo. Inclusive, apesar de fazermos também as pranchinhas, cerca de 90% da clientela continua sendo de longboarders, como consequência dos meus títulos mundiais e da minha influência na internet.
Fazer o bem
Sempre valorizei muito o lado social. Sabemos que o esporte ajuda na reintegração social das pessoas. Então, desde cedo procuro proporcionar acesso a equipamentos às pessoas que não têm condições. Conforme fui amadurecendo, tornei essa tarefa mais profissional, participando de projetos sociais. O surf adaptado também sempre foi de meu interesse. Acredito que em um futuro breve teremos incluso não só o longboard como o esporte olímpico, mas também o surf adaptado nas paraolimpíadas.
Nada no mundo vale tanto quanto poder colocar um enorme sorriso na face de um surfista. Foto: Mário Nardy
Conheci o Marquinhos Schulz, no Saquarema Surf Festival, e fiquei encantado com a atitude da família dele de incentivar uma criança com paralisia cerebral, hoje com 12 anos, a praticar o esporte. Comecei, então, a desenvolver para ele. Essa iniciativa gerou uma parceria com a Associação de Surf Adaptado de Saquarema (ASAS), no desenvolvimento de mais equipamentos. Esses equipamentos foram inspirados no Taiu Bueno, um dos grandes nomes do surf brasileiro na década de 80, que sofreu um acidente surfando e ficou tetraplégico, mas que continuou dando um show de incentivo e motivação para a sociedade, mostrando que o surf é literalmente para todos.
Aloha!
+João Chianca volta a competir no Havaí após acidente em Pipeline