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Chloé Calmon: quando o inesperado é melhor

Campeã da etapa de abertura do Circuito Mundial de Longboard de 2019 da WSL, Chloé Calmon analisa o ano de 2018 e reflete sobre suas motivações competitivas 

Por Chloé Calmon, em Polaroids, Noseriding e outras viagens, HC #344

“Um dia iremos encontrar o que tanto procuramos.
Ou talvez não…
Talvez possamos encontrar algo muito melhor do que isso.”

Fim de ano, conclusão de mais um ciclo, hora de rever quais objetivos traçados em janeiro de 2018 foram cumpridos até agora. Para mim, novembro sempre é o mês mais intenso; em dezembro tudo finalmente acaba e começa o “relax total”, que dura até janeiro.

É engraçado observar o rumo das nossas vidas e nossa adaptação diante dos desafios. Como nossa perspectiva pode mudar tanto ao longo do ano! É normal tentar prever o que vai acontecer, mas o inesperado às vezes é melhor que o esperado.

Veja também: Chloé Calmon vence em Noosa Heads e lidera circuito de longboard da WSL

No fim de 2018 fiquei quase dois meses longe de casa para competir nos três eventos mais importantes do ano. Dois deles não estavam nos meus planos iniciais. O Vans Duct Tape Invitational aconteceu na China e é o maior evento de surf clássico do mundo, organizado pela lenda viva Joel Tudor. Nunca esperei ser convidada para esse evento, por ser conhecida pelo meu estilo progressivo e moderno – totalmente o oposto da proposta de Joel, uma das minhas inspirações no longboard desde que comecei a surfar. Quando recebi o convite, achei até que era spam ou alguém brincando comigo. Naquele lugar que conheço tão bem, eu me senti bem à vontade mesmo com uma log feita especialmente para essa competição – um shape que não estou acostumada. Tive a doce surpresa de me encaixar facilmente na prancha e descobrir que aquela onda, que surfei por oito anos com uma triquilha, também era perfeita para uma monoquilha.

Chloé Calmon durante o Vans Duct Tape Invitational

Tudo nesse evento era diferente. Era literalmente pura diversão. Não tinha prioridade nem interferência, mas, sim, prêmios extras para a melhor onda compartilhada. Cheguei lá sem expectativas e, para a minha surpresa, fiz a final. E, para meu maior êxtase, ganhei o evento! Fui a primeira brasileira a ser convidada, e a ficha só caiu dias depois. Até então, era o melhor presente que havia ganhado em 2018.

O próximo destino foi Taiwan, palco do Mundial da WSL. Por muitos anos não houve outra competição importante no cenário do longboard, portanto esse era o meu foco principal. Mas surgiram circuitos mundiais paralelos, do mesmo nível de premiação e prestígio, em locais até melhores em termos de onda e acesso. Com isso, a WSL perdeu prestígio no longboard. Tornou-se “mais uma” etapa na temporada, e não mais “O” evento. Hoje a importância é dividida com o Surf Relik, que acontece em ondas icônicas como Malibu e Trestles, e o Duct Tape Invitational, que acontece em pleno US Open of Surfing, além de outros festivais de surf clássico.

Foram 12 voos em um mês. Foi punk, mas irado. Na quinta, dormi em Taiwan. Na sexta, em Dubai. No sábado, no Brasil. Domingo, no Peru. Não disse que novembro era o mês mais intenso para mim?

Fiquei frustrada por terminar no 9º lugar em Taiwan, um evento tão almejado havia anos. No dia seguinte, mudei minha perspectiva, meu olhar, meu pensamento e me senti mais leve e fortalecida.

Voltei para o Rio e fiquei apenas cinco horas em casa. Vi minha família e pedimos sushi enquanto eu desfazia uma mala para fazer outra, com roupas de borracha. Não tinha tempo a perder, os Jogos Pan-Americanos me esperavam no Peru. Embarquei para Lima na madrugada e, no fim do dia, me reuni com o Time Brasil – a primeira seleção brasileira de surf oficial, em seu primeiro ciclo olímpico.

Último evento do ano. Eu já estava cansada física e, sobretudo, mentalmente, só que mais motivada do que nunca para terminar o ano bem. Os Jogos reuniram mais de 300 atletas de 20 países das Américas em busca de uma classificação para Lima 2019 – os oficiais Jogos Pan-Americanos. O time do Brasil contava com uma equipe de 27 pessoas e tinha um staff que ajudou muito no desempenho dos atletas na água – médico, preparador físico, fisioterapeuta, técnico. Eu nunca tinha participado de um evento tão grande, com todas as modalidades juntas: surf, longboard, SUP wave e SUP race. Nem tivera um uniforme do Brasil. A cada hora que um brasileiro entrava para a bateria, o time todo cantava e gritava em todas as manobras, balançando a bandeira lá no alto.

Chloé Calmon, campeã dos PASA Games 2018, no Peru
Chloé Calmon, campeã dos PASA Games 2018, no Peru

As condições para o evento em Punta Rocas estavam ideais. Altas ondas todos os dias, pouco vento e a água com temperatura agradável, dispensando o long john. Antes de entrar na final, uma frase martelava na minha cabeça: “É a última bateria do ano!”. No começo, isso me deixava nervosa, depois relaxei. “Vai lá e faz bem-feito”, pensei. Na decisão, não parei de remar um segundo e saí da água exausta. Dei tudo de mim. Só quando saí ouvi o resultado oficial: a medalha de ouro era minha, assim como a vaga para representar o Brasil nos Jogos Pan-Americanos de 2019. Todo o time desceu até a praia para me abraçar e me carregar pela trilha super íngreme e estreita até o topo, onde ficava a estrutura da competição.

Eu já imaginava que seria impossível estar nas Olimpíadas de Tóquio, em 2020, por só incluírem o surf, tampouco que eu faria parte do time brasileiro nos Pan-Americanos, o segundo maior evento esportivo do mundo.

Fazer planos. Montar o cronograma do ano. Organizar viagens, eventos. Seja descansando na praia no calor de 40 graus ou no quarto com o ar-condicionado ligado no máximo, algo martela na minha cabeça: quais serão as surpresas de 2019?

Foram 12 voos em um mês. Foi punk, mas irado. Na quinta, dormi em Taiwan. Na sexta, em Dubai. No sábado, no Brasil. Domingo, no Peru. Não disse que novembro era o mês mais intenso para mim?

Agora escrevo de casa, no verão do Rio de Janeiro. Praia todo dia, muito sol, nem tantas ondas, muitos amigos, família, pôr do sol, mais praia, muita comida. Pensei muito nisso nestes últimos meses. Depois de um ano tão intenso, nós, atletas, temos umas duas semanas de festas com a família, virada de ano. Mas estiquei um pouco mais essa pausa para realizar algo que não fiz o ano todo: não ter planos. É realmente necessário “desligar” em certos momentos e só “ligar” novamente quando a carga estiver completa. Energia cheia para tudo: competições, faculdade, trabalho. Assim como o corpo, a mente precisa descansar.

Janeiro vem acompanhado da lista de desejos para 2019. Fazer planos. Montar o cronograma do ano. Organizar viagens, eventos. Seja descansando na praia no calor de 40 graus ou no quarto com o ar-condicionado ligado no máximo, algo martela na minha cabeça: quais serão as surpresas de 2019?

Chloé Calmon é colunista da HARDCORE.

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