O Peru, mais especificamente, a região de Huanchaco, pode ser o berço do surf. É o que defende um artigo assinado pela jornalista britânica Heather Jasper, para a BBC de Londres, com base na longa tradição dos “caballitos de totora”. Há pelo menos 3.500 anos, pescadores dessa região da costa peruana utilizam essas pequenas embarcações feitas de juncos de totora para navegar e, ao retornar da pescaria, surfavam de volta à praia. Para Jasper, essa prática pode ser considerada uma forma ancestral de surf.
Os caballitos, conhecidos como “tup” na língua Mochica, são embarcações ancestrais de aproximadamente 4 metros de comprimento, feitas de feixes de totora. Com uma proa curvada, projetada para cortar as ondas, essas embarcações permitem que os pescadores enfrentem o mar agitado da costa do Peru, que também recebe a visita de surfistas de todo o mundo em busca da qualidade de suas ondas.
O artigo aponta evidências arqueológicas que sugerem uma tradição de surfar ondas mais antiga do que no Havaí, onde o surf é praticado pelo menos desde o século 12. Cerâmicas antigas, expostas em museus como o Museu Chan Chan, em Huanchaco, e o Museu Larco, em Lima, mostram figuras que utilizam caballitos para pescar, enquanto outras, sugerem a prática de surf. Alguns historiadores, como María Rostworowski, datam essas representações em até 1400 a.C.
No entanto, por mais que o artigo da BBC apresente uma defesa interessante sobre a possível origem do surf no Peru, com os caballitos de totora sendo considerados uma das primeiras “pranchas de surf” da história, são poucas as evidências mais robustas que comprovem que essa prática era realizada de forma lúdica ou esportiva como se vê claramente no Havaí. Enquanto nas ilhas havaianas há uma vasta quantidade de evidências históricas – desde relatos, lendas ancestrais, até pranchas e pinturas que comprovam a prática recreativa do surf –, no Peru, o uso dos caballitos parece estar mais associado à atividade pesqueira do que a uma prática esportiva/ cultural.
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Ainda assim, alguns especialistas ouvidos pela BBC, como Enrique Amayo Zevallos, defendem que o surf no Peru não era apenas uma atividade funcional, mas também um esporte e um ritual. Ele aponta que uma versão mais leve dos caballitos, chamada “tupe”, feita de juncos de totora, bambu e peles de leão-marinho, era usada para competições e diversão até ser proibida pelos colonizadores espanhóis.
Caballitos de totora ameaçados
O artigo também faz um importante alerta sobre o risco do desaparecimento da prática tradicional de construir e usar os caballitos de totora na costa do Peru. Com o passar dos anos, a erosão costeira e a concorrência da pesca comercial têm tornado cada vez mais difícil para os pescadores locais manterem essa tradição milenar. Atualmente, restam cerca de 40 pescadores que ainda utilizam caballitos, e muitos jovens estão abandonando a pesca em favor do turismo ou migrando para outras oportunidades.
Independentemente das teses acadêmicas sobre a verdadeira origem do surf no planeta, o mais preocupante é o risco iminente de desaparecimento dos caballitos de totora. Essas embarcações representam um patrimônio histórico da humanidade. Sua existência simboliza uma conexão milenar entre o homem e o mar, e seu desaparecimento devido à falta de preservação e cuidados seria uma perda irreparável não só para o Peru, mas para toda a herança cultural global. Salvaguardar essa tradição é fundamental para manter viva a memória e a identidade de uma prática ancestral.
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