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Brother Aldo, autor do rap “Bate e Volta”, fala sobre sua relação com o surf: “Me salvou do crime”

Na música “Bate e Volta”, o rapper e surfista, Brother Aldo, narra, com uma impressionante riqueza rítmica, o dia a dia de uma barca para um surfista morador de São Paulo, descrevendo vários picos do litoral do estado sem perder o flow.

A música, gravada e compartilhada por Brother Aldo de maneira totalmente despretensiosa (“Gravei pra compartilhar com a galera que vive longe da praia e faz esse trajeto frequentemente”, revela) bombou em grupos de whatsapp e em várias redes sociais (só no Instagram da Hardcore foram mais de 16 mil visualizações), indo parar nos players de tops do CT.

O sucesso da canção já rendeu o convite para uma trilha no Canal Off e uma gravação em estúdio de “Bate e Volta”, com direito a vídeo clipe.

O que pouca gente sabe é que Aldo Bonfim Alves, agora cada vez mais conhecido como Brother Aldo, foi literalmente salvo pelo surf. Nascido e criado em uma comunidade violenta de Diadema, na Grande São Paulo, ele perdeu vários amigos e o próprio irmão para o crime e só não seguiu o mesmo caminho porque o amor pelas ondas falou mais alto.

No bate-papo com nosso editor assistente, Luciano Meneghello, Brother Aldo fala sobre sua relação com rap, a vida de um surfista na periferia de São Paulo e os planos para o futuro.

Como o surf entrou na sua vida?

Olá, salve a todos vocês da Hardcore.  É um imenso prazer e satisfação estar aqui sendo entrevistado pela revista que foi pra mim uma segunda escola de surf, onde faltei em pouquíssimas aulas.

Através das revistas de surf aprendi muito a respeito do esporte que agora entendo que foi ferramenta de Deus para a salvação da minha vida, por ter nascido distante da praia, em uma comunidade bastante violenta da Grande São Paulo: a Vila Nogueira, em Diadema.

Enquanto meus amigos sonhavam em ter uma arma, meu sonho era ter uma prancha e ser surfista. Acho que sou o primeiro surfista favelado da Grande São Paulo e todos meus amigos morreram no crime, inclusive meu irmão mais velho, Eduardo, vulgo Nego Dú, que também surfava e me levava para a praia de ônibus. Graças a Deus estou aqui e meu despertar foi pelo surf.

Você começou a surfar com que idade?

Descobri o surf ainda criança, ao ver os comerciais de cigarro que tinham algumas cenas de esportes radicais, e achava as imagens de surf iradas. Começou ali a minha ligação com o esporte, mas decidi mesmo que seria um surfista no final da década de 1980, assistindo a alguns programas de TV onde o surf aparecia, como Juba e Lula (Armação Ilimitada) e até novelas da Globo, como a Top Model.

Brother Aldo (à dir) ao lado do amigo Sandrinho Branco, que assim como seu irmão acabou envolvido com a criminalidade e morreu precocemente. Perequê, Guarujá, 1988. Foto: Arquivo pessoal

E como era para um garoto de comunidade da Grande São Paulo descer a serra e surfar?

No começo eu descia nas chamadas “excursões de farofeiros” que rolam em várias comunidades de São Paulo. Aqui na quebrada tinha também.

Eram várias “tiazinhas” que faziam excursões de ônibus para vários lugares, como Aparecida do Norte, Bom Jesus de Pirapora e também para o litoral.

Eu descia sempre com meu irmão, que também surfava. Às vezes demorava pra ter uma excursão pro litoral e a gente então descia de ônibus normal mesmo.

Começamos a fazer isso direto até que ele foi assassinado numa tentativa de assalto.

Deve ter sido difícil para você…

Eu fiquei muito mal na época. Acho que foi a vez que eu mais sofri. Achei até que ia morrer de tanta tristeza. Era meu irmão mais velho, meu ídolo, meu parceiro de surf, sempre me dava os toques.

Quando ele morreu eu resolvi vender as pranchas porque eu não tinha mais com quem surfar. Aí fui vender pra um amigo chamado Alan. Eu queria trocar as pranchas por uma mobilete  que ele tinha, mas quando falei que era porque não tinha mais com que surfar, o Alan falou: “Se o problema é esse, eu vou te apresentar para dois caras que surfam”.

O Alan então me apresentou para o Alex e o Bocão e comecei a descer pra surfar na Riviera de São Lourenço com os caras. Na época tava tudo em construção lá. Atualmente eles moram em Bertioga e a gente é amigo e surfa junto até hoje.

brother aldo surf
Rasgando com estilo no litoral de SP. Foto: Nosso Frame / Arquivo pessoal

Quais são seus picos preferidos no litoral de SP?

Meus picos preferidos são Guarujá, ali nas pitangueiras, São Pedro, Taguaíba, Tijucopava, Praia Branca, Bertioga, na Riviera de São Lourenço (píer); no litoral norte, Praia da Baleia, Camburi, Praia da Baleia, Praia Grande de Ubatuba, e no litoral sul, Mongaguá e Praia Grande, nas ondulações de sul.

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E o rap? Onde aprendeu a rimar?

Nascido e criado numa favela, o rap sempre foi minha maior influência musical. Quando ouvi o primeiro rap nacional do Pepeu (Nomes de Menina), eu fui totalmente impactado com o flow da rima em português com fundo de rap internacional, e junto com outros amigos comecei a desenvolver minhas primeiras levadas.

Minha primeira apresentação no palco foi aos 12 anos, numa festa da escola em um festival de inverno e cantei essa mesma música. De lá para cá vim dividindo minha vida com o surf e o rap. Mas sempre cantei sozinho.

Quais são suas maiores influências no surf e no rap?

No rap, os antigos americanos e também Wu-Tang Clan. No surf, desde Fábio Gouveia, Teco Padaratz, Andy Irons, Kelly Slater Tom Curren, Danylo Grilo e dos atuais, Filipe Toledo.

O rap “Bate e volta” bombou na Internet. Você imaginava que a música fosse viralizar?

Mesmo sendo o sonho de qualquer cantor ter um trabalho viralizado, confesso que como ainda não consigo viver do rap e hip hop, fiz o rap do bate-volta mesmo para compartilhar com a galera que vive longe da praia e faz esse trajeto frequentemente e também para que manos, que por algum motivo, pararam de surfar pudessem relembrar de todas as trips que já fizeram – e quem sabe voltar ao primeiro amor pelo surf e voltar a surfar.

Brother Aldo
Gravação do vídeo clipe de “Bate e volta” que será lançadpo em breve. Foto: Arquivo pessoal

Quais são seus planos agora que a música caiu no gosto da galera? Pretende investir na carreira musical?

Na verdade, sempre investi, pois sempre paguei os custos de produção. O rap “bate e volta” não é o meu primeiro trabalho. Já fiz trilha sonora para alguns filmes nacionais, como o longa metragem “Inversão”, de Edu Felistoque, com a música “Ziki Zira” e até atuei em dois deles, o filme “Hector” e o curta “Davi Contra os Pau Mandados de Golias” (ambos também de Edu Felistoque).

Agora estou fazendo rap do “bate-volta” versão estúdio que já está com vídeo clip gravado e pronto para ser lançado a qualquer momento em todas as plataformas de streaming.

A repercussão dessa música me fez acreditar mais no meu talento. Agora estou com mais três outros raps prontos. Um deles foi feito a pedido do Canal Off.

Quero surfar mais e sustentar minha família, levando alegria e informação através da minha arte chamada rap nacional. Agora também chamado de rap do surf.

Siga @brother__aldo no Instagram.

Ouça Brazilian Storm, de Brother Aldo:

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