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Pan-American Soul 2022: 35 anos para fazer esta foto

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em é tão espetacular. Qualquer um que já surfou Salsa Brava num dia bom de verdade viu tubos muito maiores, muito mais largos, muito mais assustadores. Assim mesmo, o valor dessa imagem é enorme para mim. Por uma razão muito simples, ela foi feita hoje, depois de 35 anos de espera. Desde a primeira vez que surfei, em janeiro de 1988, a temperamental onda que projetou Puerto Viejo para o mundo, eu sempre quis fazer um registro da direita de dentro d’água. E por uma intrincada combinação de razões, nunca havia feito. Até agora.


Texto Adrian Kojin / Editor Especial da HARDCORE
Foto de abre: Adrian Kojin em Salsa Brava

Voltemos no tempo para entender melhor o que me levou a sonhar com essa imagem por tantos anos. Quando avistei Salsa Brava pela primeira vez, dirigindo minha moto com um olho na estradinha de terra e outro no mar, tive a mesma dificuldade que todo mundo inicialmente tem de entender a onda. A esquerda, que quebra curta e grossa em direção ao canal por onde saem os barcos, é bem na cara, e muito fotogênica. Mas naquela época, antes do terremoto, muito menos surfada. Já a direita, que quebra a partir de dois picos diferentes, explode seus tubos em direção oposta à de quem a observa da praia. O surfista que bota pra dentro desaparece de vista totalmente, só ressurgindo ao final da onda, se bem sucedido no desafio.

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Somente ao entrar na água e se posicionar de frente para a direita é que o pretendente a entubar em Salsa percebe a encrenca em que se meteu. Logo fica claro que sem coragem não vai dar pra brincar. A linha que separa a diversão do eventual desastre é bem tênue, basta um vacilo para que ela se rompa. Eu particularmente fico hipnotizado cada vez que vejo um pico sugando a água da bancada, cavando um buraco enorme na base da onda enquanto a montanha acima vai subindo em direção ao céu. É bonito demais. Faz com que a crença no divino tome força e, por isso, sempre agradeço pela oportunidade de estar ali, presenciando tamanho benção da natureza.

 

Vem justamente daí a vontade de poder registrar esse momento devidamente, na pretensão de eternizar o efêmero que tanto motiva quem é apaixonado por fotografia. Seria muito mais fácil mostrar a foto do que ficar tentando explicar. Como sabiamente proferiu Confúcio, muitos e muitos séculos atrás, “uma imagem vale mais que mil palavras”. A frase do filósofo chinês foi repetida tantas vezes, que já é chavão. Mas não perdeu uma gota de verdade, o que, como explico abaixo, foi a primeira razão que me impediu de fotografar a direita como eu pretendia desde que a avistei pela primeira vez. 

Naquele longínquo janeiro, munido de uma lente Nikon com alcance de 300mm, eu não fui além das fotos feitas da areia e da montanha, assim mesmo poucas, pois o surfista em mim ganhava disparado do fotógrafo. Só que, na temporada seguinte, quando voltei a Puerto Viejo para fixar residência pelos próximos três anos, eu achei que tinha encontrado a solução. Como eu não possuía uma caixa estanque para fotografar de dentro d’água, nem encontrava ninguém que quisesse arriscar perder sua embarcação para uma série que entrasse maior, resolvi construir uma plataforma de madeira a ser instalada na bancada.

 

Para os dois lados. Salsa Brava, fotografada com celular do estacionamento bem em frente, dezembro de 2022.

E assim fiz, serrando e martelando, nos fundos do Hotel Puerto Viejo, o qual eu gerenciava, até que minha estrutura em formato piramidal ficasse finalmente pronta. Pena que ela nunca chegou nem perto do mar. Devido a razões, digamos assim, políticas, julguei melhor abandonar o projeto. Para um ainda bem reduzido grupo de surfistas que frequentava Salsa naqueles tempos, fotos não deviam ser tiradas, muito menos publicadas. Era com eles que eu dividia o pico no dia a dia, e manter a boa vizinhança se sobrepôs ao desejo de fotografar Salsa Brava da maneira que eu achava que a onda merecia. 

 

 

Já que eu não tinha uma imagem para exibir da onda que era tudo na minha vida naquele momento, recortei de uma revista Surfer a foto de Tor Johnson, um californiano que havia passado recentemente dois meses hospedado no Hotel Puerto Viejo. No texto, Tor contava que havia dado a um amigo uma câmera a prova d’água descartável e a foto publicada na revista californiana foi a primeira que ele tirou. Toda vez que alguém queria saber como era a direita de Salsa Brava, eu economizava na saliva apontando para a foto pregada na parede.

Tecnicamente falha, devido à precariedade do equipamento utilizado, assim mesmo eu, até hoje, considero esse um dos melhores registros que já vi de Salsa Brava. Ainda mais por conhecer Tor pessoalmente e saber que ele era quase da minha altura. Com mais de 1,90 m de braços abertos e muito espaço livre acima da sua cabeça, é possível perceber a magnitude do tubo. Imagina se tivesse sido clicada com um equipamento de primeira linha. A verdade é que são poucas as imagens que eu tive conhecimento que cheguem perto de fazer justiça à direita de Salsa Brava. Pode ser que existam, mas eu não vi.

Tive que deixar Puerto Viejo após o terremoto de 1991, mas nunca me saiu da mente a ideia de um dia fazer uma boa imagem de Salsa de dentro d’água. Mas, ainda que tenha voltado várias vezes durante um período de três décadas, sempre deixava para a próxima trip. Estou longe de ser a pessoa certa para a missão. Não me considero um fotógrafo profissional, apesar de já ter me aventurado nesse caminho. Muito menos um fotógrafo de surf, mesmo tendo publicado diversas imagens de surfistas e ondas. O fotógrafo profissional no meu entender é aquele dedicado integralmente ao seu ofício, combinando um olhar apurado com domínio técnico, quesito onde tenho muito a evoluir. A fotografia para mim é uma viagem sem destino estabelecido, na qual me deixo levar com enorme prazer. Hoje fiz essa imagem de Salsa Brava utilizando uma Go Pro 8. Fiquei contente. Vou tentar melhorar!

Acompanhe a rota de Pan-American Soul pelo @panamericansoul2022.

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* Nesta seção, o Editor Especial da HARDCORE, Adrian Kojin, traz com exclusividade os diários da sua road trip Pan-American Soul 2022, da
Califórnia até o Brasil. 

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