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Oi Rio Pro, dia 3: Filipe doma a Barrinha e espanta o fantasma de Slater

Filipe Toledo vence duelo emocionante com Kelly Slater em condições pesadas na Barrinha; Medina e Florence avançam, mas havaiano sente lesão

Por Fernando Guimarães

Na manhã deste sábado (22), enquanto as oitavas de final do evento feminino rolavam no Point de Itaúna, alguns surfistas desfrutavam de tubos largos, pesados e rápidos na Barrinha, na outra ponta da praia. Entre eles, Kelly Slater, que teve uma onda filmada por Jake Paterson, seu ex-colega de circuito e hoje técnico de numeroso time de atletas. “Snake”, como o australiano era chamado nos tempos de competidor, publicou alguns vídeos dessa sessão em sua rede social e certamente contribuiu para o sentimento mais ou menos generalizado ao redor do evento de que as chamadas do dia — e até as da sexta-feira — foram equivocadas. As ondas na Barrinha estavam clássicas pela manhã. Internacionais. De tarde, mais precisamente a partir das 13h35, quando começou a primeira bateria das oitavas de final do evento masculino, nem tanto.

A primeira bateria, no caso, era um duelo clássico dos últimos meses do surfe na elite mundial: Filipe Toledo, o aspirante brasileiro mais bem-quisto mundialmente, contra Kelly Slater, o recordista absoluto de qualquer coisa no esporte. Em Pipeline, Havaí, final do ano passado, Slater disse que deu umas dicas ao brasileiro, que disputava o título mundial, apenas para depois eliminá-lo junto com suas chances de conseguir o troféu. Em Bali, neste ano, brincou em uma entrevista que ia “destruir” Toledo em seu encontro nas quartas de final. A WSL reprisou à exaustão um clipe com a declaração, ao ponto de que o pai de Filipe chegou a “replicar” no Instagram de Slater com a carinhosa ofensa de “bode velho”. Slater ganhou a bateria de Filipe, dois a zero na sequência.

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Na Barrinha, Filipe dropou uma onda imensa no final de sua bateria. Não tinha tubo no outside, e ele acelerou em direção à praia, onde a tendência da maioria das ondas era fechar. Se colocou dentro de caverna, sumiu e reapareceu pouco depois, saindo pela doggy door, a porta do cachorro, como chamam nossos amigos anglófonos.

Filipe! Filipe! Filipe!, gritava extasiada a torcida, que cercava o humilde palanque alternativo na Barrinha e ocupava toda a ponta da praia.

Ao completar um tubo aparentemente impossível — ainda que não tivesse sido o melhor do confronto — Filipe selou a virada, uma vitória de valor inestimável para a recuperação de sua confiança, bem mais caro a um competidor de alto nível de qualquer esporte.

Perguntei se Kelly e ele haviam se falado antes dessa bateria.

— Não. Dessa vez eu fiquei bem tranquilo, na minha casa, e vim pro evento só na hora do campeonato mesmo. Estava muito concentrado.
— Sem mind games?
— Sem mind games. Pode vir que não cola!

Filipe abriu a bateria com uma sequência de rasgada, aéreo rodando perfeito e batida na junção. Teve gente que achou a nota 9,17 um pouco alta, mas falamos de um aéreo rodando perfeito em um mar de 2 metros. Slater pegou o melhor tubo do campeonato na sequência, um dos poucos que veio abrindo desde o outside. Passou por dentro de uma sessão, duas, poderia sair, mas viu a terceira e achou que dava, e deu: 9,50. Eles trocaram notas baixas até Filipe tirar o tubo mágico da virada. As duas ondas de Filipe contra Slater são a melhor bateria do campeonato até agora, 17,84 pontos.

Foi um dia de baterias simultâneas, como vem sendo desde a tarde de sexta, e Filipe e Kelly dividiram a metade final do duelo com o de Joan Duru e Kanoa Igarashi.

Joan Duru parecia um masoquista. O francês se jogou com o mais completo abandono em todas as maiores ondas que viu e foi recompensado com uma surra de proporções oceânicas.

Kanoa Igarashi surfou bem nas direitas, com velocidade, usando muito a borda. Parecia colado na prancha, mas não foi colocado em uma situação de pressão como Filipe e não precisou arriscar como o brasileiro.

O duelo entre eles abre as quartas de final neste domingo.

Michael Rodrigues mais uma vez não soube lidar com um mar pesado e perdeu sem constituir qualquer ameaça ao português Frederico Morais. Kikas surfou bem, tranquilo, como quem está acostumado com os invernos lusitanos que, dizem, dão tubo até enjoar.

Julian Wilson provocou um pequeno anti-clímax ao derrotar Jessé Mendes com uma virada nos minutos finais. Julian achou bons tubos, arriscando a corrida suicida no inside, como Filipe fez para derrotar Kelly, e como o próprio Kelly havia feito em ondas que não chegaram a encantar os juízes. Jessé teve ótima atuação, mas a falta de um bom tubo o deixou indefeso.

Julian comentou como é difícil surfar contra um brasileiro nessas condições. A torcida é realmente barulhenta e comemora muito as ondas dos seus. Enquanto ele conversava com os jornalistas, que na Barrinha ficavam relegados a um cercadinho na areia, um recém-convertido entusiasta do surfe nos feriados gritava a plenos pulmões:

— Wiiiiilsoooooon! Wiiiiiilsooooonnn!

Ele estava bem na nossa frente e durante horas emendou uma cerveja na outra, até o entardecer, quando já entendia tudo de surfe.

— Só faltou a bola de vôlei branca do Wilson!, riu-se o felizardo. E olhou para mim: — Aqui em Saquarema só tem louco! Hahahaha!

Julian podia não perceber, mas a torcida era simpática a ele, assim como a quase todo mundo, na verdade.

John John mais uma vez surfou como se estivesse brincando no seu playground, entrando e saindo de tubos das mais variadas largura e comprimento, arriscando aéreos, atacando junções etc etc. Ainda assim, sem ser espetacular — o lance é que ele faz parecer fácil. Mas saiu da água antes do final da bateria e, no cercadinho da imprensa, sem acesso à transmissão oficial e sem ouvir direito a locução, ninguém entendeu nada. Fui salvo pela providência materna: minha mãe assistia à transmissão da ESPN e mandou uma mensagem: “Chato que o John John se machucou, né?”

Wade Carmichael ficou sozinho no outside por alguns minutos mas não conseguiu o seis e pouco que faltava para passar. John John, dizem, sentiu o mesmo joelho que machucou em 2018; dizem também que ele ainda cogita competir sua bateria das quartas de final aqui em Saquarema, a depender da avaliação de seus médicos.

Seu adversário será Jordy Smith, que atropelou o jovem Griffin Colapinto. Jordy arrancou notas com manobras de borda, na parte crítica da onda, até chegar em seu melhor momento: surfou um tubinho pequeno e perfeito no inside e no final mandou um aéreo girando. Novamente surfou bem e à vontade, mas agora nas condições hostis da Barrinha. É um dos nomes do evento.

Kolohe Andino e Deivid Silva fizeram bom duelo. Deivid acertou umas pancadas que devia ser possível ouvir lá do Point de Itaúna. Mas a melhor delas foi a única manobra da onda, que fechou logo depois.

Kolohe variou seu repertório: entubou, completou aéreos, emendou junções, entubou um pouco mais. Está no grupo de Jordy e John John, os mais consistentes do dia entre diversas ondas surfadas, e não apenas nas duas melhores.

Gabriel Medina está num grupo só seu, por várias razões.

É o único goofy que resta no campeonato. Foi o único surfista do dia a criticar abertamente as chamadas e foi o único a demonstrar preferência por uma das duas sedes do campeonato.

— [prefiro] Itaúna, lógico! É a única esquerda que a gente consegue surfar e manobrar. Hoje achei que a chamada foi errada. Mas é… Pra você estar no tour, você precisa surfar muito se quiser ganhar o título mundial sendo goofy.

Por fim, o que faz Medina estar em um grupo só seu é a comoção que provoca nos espectadores, incomparável a qualquer outro surfista.

 

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Obrigado pelo carinho Brasil! Amanha tem mais ???❤️ ll thanks for the love. Tomorrow will be fun. #LetsGo. ✋? @kellyslater hahahah @kaiquephoto @wsl

Uma publicação compartilhada por G. Medina (@gabrielmedina) em

Ele venceu Michel Bourez em uma bateria de muitos caldos, de pranchas quebradas para os dois surfistas e de muitas direitas espancadas com o backside raivoso de quem queria ir para o outro lado.

Ao pegar sua última onda e ao sair da água, a gritaria era intensa. Por onde ele passava, corria atrás a equipe de segurança, tentando impedir que as cercas do palanque cedessem à multidão encantada.

— Medina, me dá sua cueca! Medina, me dá sua cueca!, gritou aquele mesmo torcedor, já umas cinco ou seis latas depois.

— Amigo, desce da grade, por favor, pediu o segurança, pela enésima vez.

— Você não pode me proibir de pedir a cueca do Medina!!! Medina, me dá sua cueca!!!

Quartas de final masculinas e femininas definidas para as finais no domingão, muito provavelmente no Point de Itaúna. A torcida, enlouquecida, estará presente.

Oi Rio Pro – resultados do 3º dia

Oitavas de final – masculino

1. Filipe Toledo 17,84 x 14,83 Kelly Slater
2. Kanoa Igarashi 13,17 x 10,83 Joan Duru
3. Frederico Morais 12,83 x 7,43 Michael Rodrigues
4. Julian Wilson 14,00 x 13,60 Jesse Mendes
5. John Florence 12,66 x 10,33 Wade Carmichael
6. Jordy Smith 15,63 x 9,67 Griffin Colapinto
7. Kolohe Andino 14,07 x 11,53 Deivid Silva
8. Gabriel Medina 14,43 x 9,27 Michel Bourez

Quartas de final – masculino

1. Filipe Toledo x Kanoa Igarashi
2. Frederico Morais x Julian Wilson
3. John Florence x Jordy Smith
4. Kolohe Andino x Gabriel Medina

Quartas de final – feminino

1. Lakey Peterson x Sally Fitzgibbons
2. Keely Andrew x Silvana Lima
3. Carissa Moore x Tatiana Weston-Webb
4. Stephanie Gilmore x Courtney Conlogue

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