No meio da madrugada, desperto com um estrondo em meio à chuva do 19 de fevereiro na região do litoral norte paulista.
Na cama, meu marido e nosso filho de 1 ano e 3 meses. O barulho é ensurdecedor, meu corpo não sente que é hora de acordar, volto a dormir.
A cena com a qual nos deparamos na manhã seguinte, a aproximadamente 20 metros do portão da nossa casa, localizada na Rua Olímpio Faustino, principal via de acesso à praia de Camburi, em São Sebastião, pelo trevo da Rio-Santos, é de filme apocalíptico.
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À esquerda, a aproximadamente 20 metros da nossa casa, a rua havia sido completamente obstruída por parte da terra que deslizou da montanha conhecida por “Morro do Oleoduto” [por lá atravessa um oleoduto da Petrobrás].
Sob a terra, um dos carros de um amigo da casa vizinha. PT.
Na frente do morro que desbarrancou, a imobiliária completamente soterrada.
Felizmente nenhum ferido.
“Tem três barreiras enormes na rua Olímpio Faustino. Caiu poste, caiu casa. Em 59 anos de Camburi, nunca vi nada nem perto disso. Boiçucanga inteira ficou sem luz; a Praça do Sol foi completamente destruída,” me relatou nesse mesmo dia Nilton do Amparo, nativo da região, amigo nosso com casa a poucos metros da nossa na rua Olímpio Faustino.
Já se passaram quatro dias desde que isso aconteceu. Por conta própria, desocupamos nossa casa e nos instalamos em casa de amigos. Ninguém da Defesa Civil veio nos comunicar nada acerca da nossa instalação e tomamos essa decisão em uníssono com os moradores próximos.
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Desde então, um misto de sensações tomou conta de mim. Como a de viver quatro meses em quatro dias; o luto pelos até agora 48 mortos e seus familiares; a tristeza por tantos ainda desaparecidos e pelos quase 2 mil desalojados e quase 800 desabrigados, de acordo com fontes oficiais.
Mas este caos absurdo também abriu fresta para uma luz de igual proporção, que se manifesta por uma corrente avassaladora de solidariedade.
No mesmo dia em que ficamos desalojados, nossa família conseguiu uma casa para se abrigar.
Entre os vizinhos e toda a população apta para ajudar, a solidariedade é contagiante.
O chef Eudes, do restaurante Taioba, e sua equipe, já cozinharam centenas de marmitas.
Na quarta-feira (22), Eudes foi ao seu Instagram pessoal avisar que há muitos insumos provenientes de doação, e que agora eles precisam de utensílios específicos para potencializar o preparo das refeições. Confira:
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O restaurante local Pomona, além da distribuição de marmitas, está servindo de ponto de coleta para doações.
A maioria das doações têm se concentrado no Instituto Verde Escola, na Barra do Sahy, que foi o ponto mais afetado no litoral paulista.
Contribuições podem ser feitas por meio de PIX (clique aqui); e também há um posto de doação na capital paulista. Veja:
Refeições foram servidas gratuitamente a todos que chegassem no restaurante Pimenta Rosa, na Barra do Sahy. Via Instagram, um pai cuja filha ficou “presa” na Barra do Sahy relatou sua experiência.
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Todos os funcionários do restaurante Tiê Sahy foram afetados pela tragédia, e a dona do restaurante criou uma vaquinha online para ampará-los. Da meta dos 300 mil reais, já foram arrecadados mais de 159 mil reais.
Em parceria, o pessoal do Studio Barco e do restaurante Barco Ilhas, recebem doações em três pontos diferentes distribuídos por São Paulo, SP, e Praia Preta e Juquehy – esses dois últimos no litoral norte paulista. Confira:
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O G1 criou uma página que reúne alguns pontos de coleta para doações pelo estado de São Paulo. As famílias afetadas pela chuva necessitam de doações como alimentos não perecíveis, água, produtos de higiene e de limpeza e roupas e calçados em bom estado. Confira aqui.
Da soma de tudo isso com a experiência com uma porção de amigas e amigos e vizinhas e vizinhos que encontrei pelo caminho; voluntariando-se em postos de doações; cozinhando marmitas; carregando carros abarrotados distribuindo mantimentos; emprestando geladeiras e fogões; pilotando barcos; e inclusive me fornecendo internet, comida e carinho para mim e meu filho, para esse texto ficar pronto; ecoa a máxima “Litoral Forte” – que vi na página do Instagram do restaurante Taioba.
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A reconstrução está apenas começando mas a experiência comprova na pele que a solidariedade abre caminhos inimagináveis e que o amor é a força mais sutil que tem, como disse Mahatma Gandhi.
Acompanhe aqui as atualizações sobre como ajudar a população do litoral paulista.
Texto Alexandra Iarussi