“No mesmo segundo pensei, depois dessa o John John vai perder qualquer vontade que tenha ressurgido para continuar no Tour”
Opinião | Por Adrian Kojin
Meus dois surfistas favoritos no momento, entre os que disputam o Championship Tour da WSL, são Filipe Toledo e John John Florence. Acho que são também os preferidos de muita gente. A grande final que eu gostaria de ter acompanhado no Corona Open J-Bay, encerrado ontem, teria sido um confronto entre os dois, com o incrível point break sul-africano quebrando em condições de gala.
Após ter assistido a performance épica de John John nos treinos que antecederam o evento, e tendo acompanhando na íntegra o campeonato vencido de maneira gloriosa por Filipinho, fiquei com a nítida impressão de que ninguém surfou o pico melhor que eles nos últimos dez dias.
Gostei do evento de uma maneira geral. Apesar de ter dado apenas um dia de altas ondas, o que não faltou foi drama. Isso devido à disputa acirrada pelas cinco vagas na Rip Curl WSL Finals em Trestles, ao mesmo tempo em que, paralelamente, também estava rolando a briga pela classificação olímpica. Ou seja, motivo não faltava para que todos com alguma chance surfassem seu máximo. Foi exatamente o que fizeram Toledo e Florence.
Lástima que John John tenha sido, ainda nas oitavas de finais, a vítima da vez da incompetência dos juízes, ao tomar uma virada de Connor O’Leary na última onda da disputa. Nem mesmo o beneficiário da absurda decisão acreditou. Após o término da bateria, ainda sem saber o resultado final, o australiano, a caminho da ducha, trocou algumas palavras com seu técnico, sem que nenhum dos dois demonstrasse qualquer esperança. Quando veio o anúncio, ele literalmente ficou em choque.
E eu também. No mesmo segundo pensei, depois dessa o John John vai perder qualquer vontade que tenha ressurgido para continuar no Tour. No Brasil, ele havia declarado ter passado o ano competindo desmotivado, e que só teria mudado de pensamento durante a etapa de Saquarema.
Não demorou muito e minha suspeita de que Florence poderia estar mesmo considerando abandonar o Tour foi confirmada. Numa troca de mensagens no Instagram com seu irmão do meio, ele admitiu abertamente que isso poderia acontecer. Nathan, que tem levado uma vida admirável caçando tubos sinistros ao redor do planeta, escreveu: “Mano, junte-se a mim. O Slab Tour está à espera”. Ao que John John laconicamente respondeu “talvez tenha chegado a hora”.
Não há dúvida que seria lamentável para o Tour perder uma de suas principais estrelas. Mas pode ser que os fãs do esporte acabem ganhando se John John optar por um caminho alternativo para sua carreira de surfista profissional. Ao contrário de surfistas como Filipe Toledo e Gabriel Medina, que declaradamente surfam seu melhor sob a pressão inerente às baterias, o havaiano passa a sensação de raramente estar atingindo seu verdadeiro potencial durante os campeonatos. Livre das restrições impostas pelo formato engessado da WSL, focado em surfar as melhores ondas do mundo em seus dias de gala, ele poderia elevar suas performances a patamares ainda nem sequer imaginados.
Ainda é cedo para dizer se Florence irá desistir do Tour. Seria muito improvável que ele tomasse alguma decisão apenas no impulso, como reação a um resultado injusto. A próxima parada, e última do ano antes das finais do Tour em Trestles, será em Teahupoo. Americano segundo melhor classificado no ranking da WSL, em 7º lugar, com 34.290 pontos, John John precisa comparecer ao evento para garantir com absoluta certeza que a vaga é sua.
Não tenho bola de cristal e nem informações privilegiadas que permitam uma previsão precisa do futuro. Mas não duvido nenhum um pouco que quando John John fecha os olhos e escuta seus desejos mais profundos, a vontade de conquistar um terceiro título mundial já tenha definitivamente ficado no passado. Depois da sapatada na orelha tomada no Corona Open J-Bay, que diminuiu substancialmente sua chance de se classificar para a disputa do caneco esse ano, suspeito que ele ainda sonha em tentar a medalha de ouro em Teahupoo, mas sei que seu coração está mesmo é no mar, não num palanque.