Por Cássio Sanches Foi em 1981 que o aussie Simon Anderson apareceu em Bells com sua nova criação: a thruster, uma prancha de rabeta quadrada com três quilhas. Jamais patenteada pelo criador, este modelo virou referência de prancha ideal, deixando para trás modelos de uma e duas quilhas. Neste texto, o surfista profissional Cássio Sanches manobra no caminho inverso, explica seu amor pelas old school e revela que a invenção de Anderson não o satisfazia mais. Eu achava que sabia surfar até pegar a primeira onda de monoquilha. Ao cair na primeira curva, vi que ainda tinha muito a aprender. Minha geração de surfistas chegou com tudo mastigado. Pranchas leves, designs sensuais e as ultramodernas triquilhas. A evolução acontece rapidamente e com a pressa obrigatória de fazer algo novo, como completar um aéreo com um giro absurdo. Com isso, acabamos esquecendo de pequenos detalhes, como um simples deslizar sobre a onda ou até mesmo o fato de completar uma manobra por vez. Digo sinceramente que andei um tempo confuso a respeito do esporte. Parecia estar surfando por obrigação, me estressando por não completar uma manobra. Já não possuía mais aquele prazer de quando era criança, de ficar feliz apenas em estar no mar com os amigos. Isso andava me fazendo mal. Refleti bastante e cheguei a conclusão de que deveria rever meus conceitos. Decidi recomeçar, daquela parte que meu pai dizia o quanto era divertido a época das monos e biquilhas. Num estalo resolvi que deixaria de lado a “corrida maluca” da evolução em termos de performance e me voltaria somente para o desenvolvimento pessoal. Isso começou numa surf trip para Baja California. Ao visitar uma loja local para comprar parafina, me deparei com uma monoquilha original de 72, toda reformada. Me apaixonei – a hora de recomeçar havia chegado. Abandonei minhas triquilhas por um tempo e me viciei na tal monoquilha. Me divertia em todas as sessões, qualquer condição me deixava plenamente feliz. Sou um novo homem, um novo surfista. Fui para África e minhas triquilhas foram apenas à passeio. Surfei quase todas as sessões com minha single fin. Essa prancha não tem medidas escritas, mas acredito ser uma 7 pés, rabeta swallow. Chegando ao Brasil, pensei em fazer um quiver sem triquilhas para a minha próxima viagem. Tive uma conversa com meu shaper Zampol e levei a mono para ele ver. Encomendamos uma, mas totalmente diferente, menor e mais moderna. Uma biquilha com fundo, curva e medidas o mais próximo possível das originais de época. Então, parti para o deserto peruano, na casa do amigo Nacho, com a intenção de não fazer nada além de aperfeiçoar minha linha com os novos brinquedos. Vivi incríveis 30 dias no meio do deserto, sem nada para fazer a não ser surfar e observar esquerdas alucinantes por todo o dia. Foi nessa trip que entendi como fazer um carving com a borda até o fim do movimento. Faço curvas com ela que não consigo com as triquilhas. A grande diferença entre a prancha com três quilhas e as old school, é que a primeira possibilita movimentos mais curtos, proporciona a entrada da manobra numa parte mais íngrime do bowl, onde acontecem as modernas rabetadas. Por ser mais grossa e obter mais área no bico e centro, as pranchas antigas são mais difíceis de andar por onde as triquilhas te levam. Você é obrigado a fazer outra linha, é necessário estudar a prancha e entendê-la para poder se divertir. Resumindo, é preciso dançar conforme a música.” Surfo com a monoquilha em todas as condições, seja em onda grande tubular ou numa marola gorda. O forte dela é a velocidade, a possibilidade de aplicar um hang five, as curvas e a diversão num mar ruim, indo apenas no corte da onda. Com a mono 6’4″ necessito de um pointbreak acima de 4 pés ou de um beachbreak tubular. Já a biquilha segura bem nas curvas e tubos. Tenho a impressão de não existir sessão fechando quando estou com ela. Para mim, o interessante da vida é aprender algo novo e tentar me adaptar a tudo, não me prendendo a um só caminho. Surf é surf, e não importa a combinação de quilhas.