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Entrevista: Danilo Couto

 


Foto: Morgan Maassen

 

Por Adriano Vasconcellos

Aos 39 anos, o baiano Danilo Couto é um dos big riders mais respeitados da atualidade e o responsável por expandir os limites do surf na remada ao encarar ondas históricas em Jaws no braço ao lado dos “Mad Dogs” baianos Márcio freire e Yuri Soledade. A recompensa veio em 2011, com o título da principal categoria (onda do ano) do XXL, a maior premiação da modalidade. Desde então, Danilo tornou-se referência no big surf e, além de liderar um prestigiado treinamento no North Shore de Oahu, Hawaii, também persegue as maiores ondulações do planeta ao lado do parceiro Kohl Christensen. Em sua casa em Waialua, onde vive com a esposa Laura e os dois filhos pequenos, ele concedeu uma entrevista exclusiva à HARDCORE e falou sobre diversos assuntos que envolvem o universo do surf em ondas gigantes.

 

Esta edição da HARDCORE propõe a temática “Treinamento – Prancha – Tecnologia”, equação inseparável para o big surf. Como você estabelece essa conexão com cada um dos temas para o esporte?
Sem dúvida, esses são três fatores principais para o sucesso do surf em ondas grandes. Primeiro você tem que estar muito bem preparado física e mentalmente, e a única maneira para adquirir essa condição é através de treinamento. Então tem que ter disciplina, porque o swell pinta a qualquer momento e, dependendo do lugar, a sequência de voos pode ser muito pesada. A única maneira para chegar bem ao destino final é realmente estar preparado. A parte de prancha também é essencial. Você nunca vai pegar uma onda gigante com uma prancha errada. Por isso, é necessário um quiver com vários modelos diferentes. Eu particularmente tenho umas oito só para condições extremas. E tanto nos treinos como no equipamento existe muita tecnologia envolvida. A previsão, por exemplo, é outro fator tecnológico primordial, porque no surf de ondas grandes é necessário uma condição muito perfeita de vento, maré e direção do swell. É preciso saber as condições detalhadas para estar no lugar certo e na hora certa.

Qual é a sua base de treinamento? Como equilibra corpo-mente-espírito?
Por ter o privilégio de morar no Hawaii, fiz do North Shore a minha base para o treinamento.  Passo muito tempo dentro da água, então surfo desde os dias pequenos até os grandes. Agora mesmo estou recebendo mensagem de texto para surfar uma valinha de meio metro aqui do lado de casa. Sou realmente fissurado e tenho pranchas que vão de 5’10’’ a 11 pés. Essa época do ano tem muito vento e diariamente rola essa onda de meio a um metro aqui perto. Também gosto de equilibrar o surf com muita natação no mar e aulas de ioga. Para mim essa é a trinca perfeita, mas sempre procuro mesclar tudo com períodos de treinamento funcional, além de trilhas de bike e travessia de SUP. Dependendo da condição do dia, tento intercalar todas essas atividades.

E quais são seus quiver e shapers? Pode falar o porquê das preferências?
Trabalho com uma variedade de shapers, até por usar diferentes tamanhos e tipos de prancha. Nas médias e menores, eu desenvolvo um trabalho com a Wetworks, do Ricardo Martins, Claudio Hennek e Joca Secco. Já minhas gunzeiras quem faz é o Jorge Vicente, meu principal shaper atualmente. Mas como ele se mudou do Hawaii e não tenho a mesma disponibilidade de fazer pranchas com ele, então venho trabalhando com o Fletcher Chouinard, shaper da Patagônia (filho do fundador da marca, Yvon Chouinard). Tenho feito com ele algumas gunzeiras e pranchas para Big Pipe. Todas muito mágicas.

O prazer e a qualidade de vida fazem você ficar tão jovem por tanto tempo que no final das contas o benefício é grande. Acho que queremos sempre ter saúde para viver mais, e sem dúvida o surf é capaz de trazer essa felicidade, esse prazer de surfar. Para mim, manter-se saudável é a maior herança do surf.

Você é muito respeitado no Hawaii. Isso é fruto de postura, conduta e atitude dentro do mar. Mas você ainda é alternate do Eddie Aikau, mesmo depois de vencer o XXL e fixar residência em Oahu. O que falta para você figurar na lista principal?
São muitos fatores, e você citou alguns que contam ao meu favor. Mas existem outros que não estão nas mãos do surfista, e sim de organizadores, patrocinadores, etc. O Eddie Aikau por si só é a celebração de uma lenda do Hawaii, de uma grande figura que marcou toda uma comunidade, então antes de tudo é a celebração da cultura havaiana. É um evento local e eles priorizam a presença dos surfistas locais. Sobra pouco espaço para atletas de outros países. Mas sei que a cada dia estou mais próximo da lista principal. Ano passado já fui o segundo alternate e as três primeiras vagas de alternate são muito concorridas, pois, se o evento acontecer, é bem provável que esses estejam dentro. Então, já vi que realmente eles têm uma intenção muito boa de me colocar no Eddie Aikau.

A pergunta agora volta-se ao Big Wave World Tour, evento que foi assumido pela ASP. Como você interpretou a falta de convite para participar da etapa em Pico Alto, sendo que até alguns surfistas desconhecidos figuravam entre os competidores? Você tem algum convite prévio para participar de alguma etapa do BWWT?
O BWWT começou há uns cinco anos, e nos primeiros eu participei de vários eventos. Foi um campeonato criado com muita vontade pelo Gary Linden, sem nenhum apoio financeiro, tudo feito na raça. Mas chegou um ponto em que as coisas começaram a ficar complicadas. Os atletas não queriam ir mais, pois não tinha estrutura, recompensa de premiação e era um sistema complicado de julgamento. Também começaram a fazer eventos em ondas de 12, 15 pés, quando o ideal são 20.

Naturalmente, muitos atletas começaram a desistir, e eu fui um deles. Isso abriu espaço para outros atletas que passaram a participar e figurar nesse ranking. Então, a partir do momento em que a ASP entrou e assumiu,  eles honraram os atletas que começaram a participar nesses últimos anos. É bom para o esporte, e torço muito para o sucesso do Circuito. Não fui convidado para nenhuma etapa este ano, mas esse realmente não é meu foco. Gosto da liberdade de buscar os maiores swells nos melhores lugares, e tentar dentro desse pacote explorar novas ondas. Só acho que tanto eu como Marcio Freire e Yuri Soledade merecíamos um convite para o evento em Jaws, que é uma onda diferente das demais, por tudo que fizemos neste pico nos últimos anos.

Como foi esse último big swell em Arica, no Chile?
Foi o primeiro grande swell da temporada, com 20 pés plus. Puerto Escondido, no México, ficou na casa dos 15 pés, mas todos sabem como lá é cabuloso, enquanto Pico Alto, onde rolou o BWWT, ficou na casa dos 15 a 18 pés. Lá no Chile já era de se esperar que fosse um pouco maior, pois o swell vem lá de baixo do continente e quebra com mais força. Eu e Kohl Christensen, que é especialista aqui no Chile, entramos em contato com Ramon Navarro e inicialmente fomos lá para o sul do Chile, para Punta de Lobos, só que o swell bateu bem durante a noite e a gente acordou com vento maral, então estava ruim. Depois seguimos para o norte do país, que já era o destino escolhido. Chegamos lá e estava do jeito que imaginávamos, altas ondas. Dei sorte de pegar uma das graúdas.


Danilo Couto está inscrito na categoria Maior Onda na Remada do XXL com essa bomba surfada no dia 3 de julho em El Buey, Arica, litoral norte chileno. Foto: Margarita Adrovez

Você tem liderado um encontro sobre segurança no outside para o big surf, chamado de “Fórum de Avaliação de Risco”, realizado anualmente em Turtle Bay, Oahu. Fale um pouco sobre o projeto e o que você está programando para essa temporada.
Formei um grupo com o Kohl, meu parceiro de viagens de ondas grandes, e Brian Keaulana, waterman legend aqui do Hawaii, e estamos crescendo aos poucos. Obviamente não é fácil, porque não é um evento que traz retorno financeiro, é apenas para a evolução da segurança no esporte. Temos o intuito de divulgar as técnicas e os treinamentos para que todos estejam mais bem preparados para resgatar o próximo. É um evento de portas abertas. Agora, quando estivemos no Chile, tentamos expandir essas técnicas. Nos reunimos com a comunidade local de Punta de Lobos e fizemos um intercâmbio. Também queremos levar o evento para Mavericks, onde há uma grande comunidade do big surf. O que queremos passar é uma nova postura no outside. Entra-se não somente preocupado em pegar a sua onda e sair, mas em ter um olhar diferente no lineup, de um olhar pelo outro. Você passa a estar treinado para salvar, como tirar uma pessoa da água, como fazer uma reanimação, como se chama o serviço de emergência, entre muitas outras coisas.

Quais foram as suas inspirações? E hoje, quem você respeita no big surf?
Tem uma pessoa que foi muito importante assim que eu cheguei ao Hawaii, chama-se Greg Russ. Ele é completamente  underground, mas todo mundo que frequenta Hawaii, Califórnia ou México conhece. É uma cara casca-grossa e assim que cheguei aqui dividi muitas sessões com ele. Mas minhas inspirações são várias. Tem Rodrigo Resende, o “Monster”, meu principal mentor; Shane Dorian, que é um cara que melhora a cada ano que passa, já passou dos 40 anos e mostra que se você quiser vai ficando mais jovem com o tempo. Também não posso deixar de falar do meu parceiro de barca, Kohl Christensen, que talvez seja o cara que tenha menos medo no outside, além de Ross Clarke-Jones, que para mim sempre foi um master nas ondas grandes.

E agora, quem você enxerga como sucessores dessa nova geração de big riders, entre brasileiros e estrangeiros? E você acha que a nova geração já chega mais preparada?
Tem muitos atletas aí chegando. É interessante ver que essa nova geração está correndo atrás um pouco mais do que antes. Hoje, saiu um pouco daquele básico que era dropar um ‘Waimeazinho’ ali. Hoje em dia, o patamar está um pouco mais alto. Aqui no Hawaii, tem que destacar a galera de Maui, Albee Layer, Billy Kemper e Tyler Larronde. Do Brasil, tenho sempre que falar do Lapo Coutinho. Eu sinto que pela idade ele já adquiriu uma maturidade e um go for it nervoso. Temos ainda o Gordo (Felipe Cesarano), Pedro Scooby, Diego Silva e Lucas Gonzaga, que mora lá no Chile e é um moleque com muita atitude. Lucas Silveira, que há muitos anos acompanho aqui no Hawaii e evoluiu pra caramba. A nova geração já mostrou que está preparada, mas falta ainda subir um degrau. Existe um diferencial a partir do dia que você quer surfar ondas oceânicas de 25, 30 pés havaianos. Vira outro patamar. E vai depender deles, eu particularmente acho que levam jeito.

Na vida do big surf, quais são os maiores prazeres e sacrifícios do esporte? E como se molda a corrida em busca dos swells junto à família?
O prazer de descer a onda com certeza é o maior. E ainda conseguir viver disso é maravilhoso. Acho que grande parte do sacrifício é ficar um pouco longe da família – mas isso conseguimos contornar muito bem – e tem também a parte financeira. Por mais que a gente viva do esporte, viaje, não é uma profissão que talvez você junte muito dinheiro ou que se estabilize financeiramente. Mas, por outro lado, o prazer e a qualidade de vida fazem você ficar tão jovem por tanto tempo que no final das contas o benefício é grande. Acho que queremos sempre ter saúde para viver mais, e sem dúvida o surf é capaz de trazer essa felicidade, esse prazer de surfar. Para mim, manter-se saudável é a maior herança do surf.

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