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10 Perguntas: Gordon Merchant

Por Kevin Damasio
HC #328 – 28 anos, maio/2017

Um australiano de tipo simples, introspectivo, mas que ganhou o mundo com o lema “Only a surfer knows the feeling” (em tradução livre: “só um surfista sabe o sentimento”).

Nos anos 1960, gordon projetou sua vida futura e concluiu que não desejaria ser um velho shaper. Por isso, fundou a Billabong, em 1973, com sua esposa Rena.

Apoiou surfistas locais da Gold Coast, produziu bermudas e bateu de surf shop em surf shop, em busca de lugares para vendê-las.

Hoje, são os vendedores que vão atrás deles, nas flagships que difundem conceitos e produtos de uma marca cuja presença é fundamental na história do surf – com campeões mundiais (Mark Occhilupo, Andy Irons, Joel Parkinson), eventos tradicionais no Tour (Rio Pro, J-Bay, Tahiti Pro, Pipe Masters) e investimento pesado na nova geração, no Brasil representada por Ítalo Ferreira, Victor Bernardo, Lucas Vicente, Dudu Motta e Kian Martin.

No início do outono, Gordon Merchant esteve no Brasil pela primeira vez desde meados de 1980, quando licenciou a Billabong no país, e conversou com a HARDCORE sobre negócios, princípios e o atual momento do surf.

Gordon Merchant, o fundador da Billabong, em visita ao escritório no Brasil. Retratos: Giulio Paletta

Sobre os princípios no mundo do surf, você acredita que algo tenha mudado desde aqueles tempos em que fundou a billabong com sua esposa, em 1973?

Só um pouco. É difícil pegar uma onda na Gold Coast agora, muito mais do que costumava ser (risos). No início, nós surfávamos em Burleigh… costumávamos  surfar sozinhos naqueles tempos, com 10, 15 surfistas. Não era tão crowdeado. Nos dias de hoje é inacreditável. Cem pessoas na água em um dia de sorte. Entre 400 e 500 cabeças de Snapper até o fim da Gold Coast. Um cara dropa, surfa um pouco, logo outro dropa, surfa um pouco, um outro dropa…

Antigamente, o surf tinha um caráter de contracultura. Hoje, há uma onda extremamente conservadora no mundo, com apoio a discursos de, por exemplo, Donald Trump, dotados de preconceito, racismo, xenofobia. isso afetou o surf de alguma forma?

Eu não chamaria de contracultura hoje. Penso que tem um caráter muito mais desenvolvido e há tantos surfistas! Nos anos 60 e 70 era definitivamente parte da contracultura, sem dúvida. Por isso eu saía falando: “Only a surfer knows the feeling”. Não falamos mais de contracultura como antes, porque eram apenas aqueles surfistas malucos que iam atrás de ondas e nada mais. Ainda é maluco, mas diferente.

Como você disse, o surf se expandiu e alcançou um público diferente. O que pensa sobre a massificação do surf como estilo de vida?

Eu acredito que o surf é um lifestyle fantástico, para o qual muitas pessoas são atraídas. E há muito pelo que ser atraído, só pelo prazer de cair na água. Tem sido fantástico para mim. Descobri que, se você trabalhar nisso realmente para os surfistas core, os outros provavelmente se interessarão. É simplesmente uma marca incrível. Mas não foi tão fácil. Levou muito tempo para construirmos a Billabong.

Quais foram os maiores desafios pelos quais passaram na billabong?

Falta de dinheiro. Nenhuma grana. Na época, nossas três filhas eram pequenas. E nós botamos tudo que tínhamos no negócio. O futuro poderia ter seguido muitos caminhos diferentes. No fim das contas, crescíamos cem por cento a cada ano. Foi uma mudança enorme. E surgíamos no meio dessas empresas que estavam muito mais estabelecidas, especialmente do ponto de vista do marketing e coisas do tipo. Quando começamos, a maior parte das pessoas que desenvolvia boardshorts para surfistas não era surfista. Então eles, na verdade, não sabiam o que os surfistas de fato queriam. Então, apareceu a Billabong, a Quiksilver, a Rip Curl – nós éramos surfistas. E isso tornou bem mais fácil para nós na questão de promover as marcas, de saber o que os surfistas procuravam, que tipo de boardshort cairia melhor, com que materiais deveria ser feito, todas essas coisas. Por isso saíamos muito à frente de quem não tinha ideia alguma, de quem se limitava à confecção e não surfava.

Em São Paulo, Shannon North, presidente global da Billabong, Gordon Merchant, o fundador, e Fernando Machado, general manager do grupo GSM Brasil (Billabong, Element e RVCA). Foto: Giulio Paletta

Quando você sentiu que a empresa entrou nos trilhos?

Foi tudo muito gradual. Não teve um grande ponto de guinada, na verdade. Apenas trabalhávamos e evoluíamos. Eu lembro… acho que gastei um milhão de dólares para registrar meu nome pelo planeta. E esse foi todo o dinheiro que fiz em um ano. Eu pensava de mim, por gastar tanto dinheiro: “Que maluco!” (risos) Felizmente, tivemos sucesso. Pensava que, para nos tornarmos competitivos, precisaríamos ser uma marca global. Teríamos que fazer mais do que apenas boardshorts. Começamos a patrocinar surfistas locais da Gold Coast, e então fomos progredindo. Acredito que temos um bom olho para saber o que é um bom surfista.

Nos anos 2000, a Billabong entrou na bolsa de valores. O que esperava com essa ação? Como manter os princípios da Billabong ao dividí-la com sócios que não são necessariamente surfistas?

Eu e minha família tínhamos botado muito dinheiro na Billabong. Toda nossa grana estava amarrada na empresa. Então essa foi uma forma de recuperar um pouco do investimento, e construir uma casa, receber um retorno por tanto esforço que botamos naqueles primeiros anos. Pouco antes de a empresa ir à público, minha parceira Rena, com quem fundei a Billabong, pensava em fazer mais coisas na Austrália, ampliar a fábrica na Europa. Investíamos tudo que tínhamos, todo ano. É muita pressão. Então, esse foi um momento de grandes mudanças, porque tivemos novos sócios. É sempre um desafio. Eu acho que eles confiam em mim para guiá-los. O trabalho aumentou bastante por sermos uma empresa pública. Há muito mais responsabilidades envolvidas. Fico na direção dia e noite há 18 anos. Tem sido um belo aprendizado para mim.

Como a Billabong se manteve diante de toda a crise vivida no mundo desde 2008? Teve reflexos no surf profissional?

Nós sofremos como todo mundo. Cometemos alguns erros. Crescemos pouco a pouco. Afeta todo mundo. É legal termos a WSL agora. Eles começaram a comandar os eventos, a organizar todo o Tour. Percebemos que botávamos muito dinheiro nos eventos e não tínhamos tanto retorno. Então, estamos com os dedos cruzados para que eles mirem um futuro distante. Mas o surf profissional é mainstream agora. Está no noticiário. Tornou-se público para o mundo inteiro.

Antes mesmo de entrar na elite, Ítalo Ferreira, com seu peculiar go for it, chamou a atenção de Gordon Merchant. Em janeiro de 2016, o rookie de 2015 entrou para o time da Billabong. Foto: Ryan Miller

O que o surf no mainstream mudou para a Billabong? Qual é a importância de continuar na mídia de surf?

Apenas ampliou nosso alcance. E será bom, desde que continuemos o mesmo caminho desde que criamos a empresa. É muito importante permanecer na mídia especializada. Precisamos continuar estimulando, para manter os clientes estimulados. Desenhar novos produtos, apostar em novos surfistas. As pessoas sempre gostam de ver um cara jovem se superando e conquistando os objetivos. O surf se ampliou, mas precisamos manter tudo isso. O que oferecemos é uma filosofia, e os consumidores a seguem.

No Brasil, vocês patrocinam novos talentos, como o Dudu Motta, Lucas Vicente, Victor Bernardo, Ítalo Ferreira. Como vê essa nova geração? E como o Ítalo te impressionou?

É muito empolgante. Há muito talento surgindo no Brasil. Dez anos atrás era a Austrália. Agora o momento é de vocês. É saudável, é ótimo. Eu sempre estive mais focado no Ítalo, e disse que precisávamos patrociná-lo. Estava em um campeonato em Portugal, na época em que o Ítalo tentava se classificar para a elite. Tinha uma fechadeira insana, grossa, de 4 a 6 pés, e ele se atirava. Desde então, eu o observava aqui e ali. Sabia que ele era um grande surfista. Ele puxa o limite. Os aéreos que manda são simplesmente incríveis. É demais termos um surfista tão empolgante no nosso time..

Andy Irons e Ricardo dos Santos continuam no time da marca. O que eles representam para a Billabong?

Eles foram pessoas incríveis. Fizeram parte da construção da marca. Possuíam um go for it muito parecido. Não havia dúvida: eles se jogariam, não puxariam o bico. Eram surfistas muito hardcore, e gostamos de patrocinar gente assim. Eles representam a imagem que queremos difundir: um surfista que sempre busca as melhores e mais desafiadoras ondas que pode encontrar, para desempenhar o melhor de suas habilidades. HC

Andy Irons, assim como Ricardo dos Santos, sempre será homenageado pela Billabong por ajudar a construir a imagem core da empresa. Foto: Tom Servais

Esta entrevista foi originalmente publicada na HARDCORE #328 – 28 anos, em maio de 2017.

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