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Entrevista com Fabrício Flores, da Sea Cookies Handshapes

Texto Alexandra Iarussi | Foto de abre: Marcelo Schmoeller

 

“Engraçado isso, mas eu sempre fui shaper. Sabia que seria shaper em algum momento. A marca Sea Cookies existe desde 2000 desenhada no meu violão, mas foi virar seda de prancha apenas 14 anos depois”, conta Fabrício Flores Nunes. Criador da fábrica de pranchas alternativas Sea Cookies Handshapes, Fabrício, 39, surfa desde os sete anos. Mora em Florianópolis desde 1993, onde acumula algumas funções criativas: tem dois pós-doutorados em Aquicultura e é o criador do Lagoa Surfe Arte – LSA –
festival já realizado em duas edições que reúne as variadas artes visuais ligadas à cultura do surf em Floripa.

Antes mesmo de pensar em criar o primeiro modelo, há aproximadamente três anos, teve lições valiosas com o pai e o avô materno, que lhe ensinaram sobre ferramentas. “Hoje trabalho praticamente com qualquer material; particularmente, adoro trabalhar com madeira e já fiz algumas coisas. Durmo em uma cama que fiz de madeira de demolição, em casa tenho mesa, estante, bancos, horta, tudo feito de madeira. Sempre gostei de trabalhos manuais. Especificamente sobre pranchas, sempre lia muito antes de encomendar uma nova ou comprar uma usada.”

Foto: Marcelo Schmoeller

“Todas as pranchas que eu encomendei eram apenas desculpa para adentrar a fábrica e ver como era fazer uma prancha. Esse universo sempre me encantou muito.”


A PRIMEIRA PRANCHA

Inventar está no DNA do shaper e criar a primeira prancha foi passo natural para o surfista que queria desbravar as ondas com mais intensidade e particularidade única.

Comprei meu primeiro bloco depois de visitar um amigo que estava desgastando as espumas na churrasqueira da casa dele. Quando eu vi até onde ele tinha ido, pensei, ‘Posso ir além’, e fui comprar um bloco para me arriscar. Naquele momento percebi que poderia fazer uma prancha também. Com toda experiência que tinha com outros materiais, tinha segurança de me arriscar com PU ou EPS e estava aberto para ‘entender’ o que os novos materiais poderiam me ‘dizer’. Decidi que faria meu primeiro design na casa desse amigo, mas, quando fui orçar a laminação e o laminador escutou essa história, me ofereceu uma sala na qual ele finalizava os shapes usinados para trabalhar. Não poderia ter sido melhor.”

Foto: Marcelo Schmoeller

Sem grana para comprar uma plaina elétrica, Fabrício comprou o básico: régua template, plaina manuais para desbastar a longarina, surform e lixas de madeira. Levou umas duas semanas shapeando a primeira prancha, a “Pumpkin Seed”, uma 5’10” singlefin, feita aos poucos nos horários livres.

“Na época me recuperava de uma torção no joelho e voltar ao surf com uma prancha feita por mim foi indescritível. Até hoje, a sensação é presente. Lembro com clareza a primeira onda da primeira prancha que fiz. Fantástico. Depois dessa fiz mais uma sem uso de energia elétrica, toda na lixa, uma assimétrica para goofies, sendo 6’1” x 21 ¾” fish twin de frontside e 5’9” x 19” round quad de backside. Batizada inicialmente de “Crooked”, ganhou o nome definitivo de ‘Dr. Freak’ (no caso, eu mesmo!) depois de passar 14 dias em Lobitos (Peru) e se tornar a melhor prancha da viagem. Depois dessas duas recebi minha primeira encomenda, uma mini simmons 4’11” e tive que comprar uma plaina.”

Acima, a The Fishenstein – 5’7″ x 21″ x 2,5″- criada para o Creators and Innovators Upcycle Contest, da VISSLA Brasil. Foram utilizadas mais de 126 pedaços de isopor que eram lixo, 600 g de cola PUR, dois rolos de fita adesiva, um tronco de agave, quilha de restos de compensado naval, laminação epóxi com kevlar e 40 dias de dedicação (da coleta dos materiais ao teste do projeto).

Fishenstein, feita para o concurso da Vissla – e posteriormente comprada pelo dono da marca Paul Naude. Foto: Reprodução


UM POUCO DE TUDO

Fabrício já shapeou pranchas finless, assimétricas, biquilhas, monoquilhas, quadriquilhas, shortboard performance e recentemente um longboard com três longarinas. Gosta mesmo é das biquilhas e mini-simmons.

“O surfe com biquilha é tão natural e fluido. É feito para ser sem esforço. Vejo essas pranchas como a extensão perfeita do surfista.”

Shapeou até hoje 17 pranchas, todas para amigos próximos. “Minha paixão e meus questionamentos hidrodinâmicos me afastam do que o grande mercado consumidor quer adquirir. Faço pranchas para quem quer se divertir no mar, polir o surfe, reencontrar a alegria de surfar, de quem está cansado em tentar ser quem não é e aceitar se descobrir.”

Fish biquilha 5’7″ feita para a marca de biquínis paulistana a.Mar. Foto: Caio Palazzo

Sempre preferiu fazer pranchas mais largas que o normal. “Tinha 18 anos e via aquelas pranchas estreitas, com borda fina, 18” de meio e rockers exagerados. Isso nunca me conquistou”. Conforme ele conta, vem dessa predileção o nome Sea Cookies, “das minhas pranchas e percepção de que esse é o caminho. Pranchas largas, como bolachas. Pranchas para o mar, bolachas do mar. Pranchas que proporcionam remada, permitem entrar na onda com facilidade, otimizam o tempo do surfe e aumentam teu quantitativo computando, mais ondas por sessão. Além do mais, se você surfa muito mais e cansa menos, é muito melhor”.

“Sempre gostei de novidades. Testo e experimentos materiais e técnicas há pelo menos 20 anos. Estudo construção naval também, principalmente designs de lanchas de corrida, planing hulls…”

 

Foto: Marcelo Schmoeller


A BUSCA: FLUIDEZ

“Minha busca nesse universo de fabricação de pranchas é fazer a prancha mais fluida possível, proporcionando velocidade para quem usa, tornando o surfe mais recreativo do que esportivo. As Sea Cookies também se diferem no acabamento. Pretendem ocupar a sala de estar ou jantar de quem as adquire. São esculturas funcionais extremamente bem acabadas, peças de arte mesmo. A prancha de surfe da grande maioria dos surfistas fica mais tempo fora da água do que dentro dela. Então porque guardá-la na garagem ou no homebox? Quem tem uma Sea Cookies, tem arte no deck e inovação e engenharia no bottom.”


AGORA NO SHAPE ROOM?

Uma 5’7″ em collab para a arquiteta catarinense Juliana Pippi e uma assimétrica 5’7″ que vai para uma surf trip nas Maldivas, com o surfista de Santos (SP), Daniel Ferlin.

“Ainda não vivo da Sea Cookies, mas vai chegar o dia. O mercado de pranchas é um mercado complicado no Brasil devido ao alto custo de produção e ao peso que a grande maioria dá às sedas dos bicos das pranchinhas brancas. A satisfação em fazer uma prancha é enorme, alegro-me ao criar algo que flutua e fará alguém feliz! O mercado de pranchas é disputado mas a Sea Cookies se encaixa paralelamente a ele. Sempre fui meio “marginal” culturalmente… Floripa é uma das cidades que mais concentra shaper por m² e a maioria dos surfistas ainda está preso ao design convencional. Ter um quiver com diferentes pranchas só proporciona satisfação: se você tem apenas uma prancha high performance, vai acabar usando-a em todas as condições – e tem dias que o mar está para uma singlefin. Tem dias que você está para uma singlefin. Ter mais de uma prancha faz você variar, aprender novos caminhos, se divertir de diferentes formas. Experimentar é manter-se vivo. Há que acorde antes…”

Assista abaixo ao vídeo do LSA 2016:

 

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