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triunfo de mineiro


Por Julio Adler

Dessa vez faltam palavras – e sobram.
Esse foi o melhor campeonato de surfe de toda história por uma série de eventos que merecem ser mencionados.
Em primeiro lugar, não lembro de ter visto a ASP realizar uma etapa inteira em dois dias em meio.
O Rip Curl Pro de Peniche começou as 13h15 de domingo e terminou às 18h35 da terça em ondas que nunca deixaram de ser, no mínimo, espetaculares.
Nenhum dos membros mais antigos da ASP lembravam algum outro evento, onde tivemos mais ondas excelentes e boas do que razoáveis.
Surfistas perderem disputas mesmo com uma nota 10, caso do Julian Wilson contra Taj Burrow.
E o mais importante de tudo, Mineiro venceu!
E venceu de forma contundente.
Vejamos o que se passou nesses dois dias pra nunca mais esquecer.

O Despertar

Se no domingo a tarde já tínhamos visto Supertubos abrir sua mandíbula discretamente, na segunda feira a fera acordou de vez. Tubos de 6 a 8 pés, pros dois lados a menos de 30 metros do público de pé na praia.
A proximidade do surfista com a calorosa torcida portuguesa, que vibrava e aplaudia cada onda como nenhuma outra, dava um ar de arena ao campeonato, meio tourada, meio jogo de futebol.
Alejo, Bruninho, Raoni, Miguel e Jadson perderam todos em baterias apertadíssimas que foram resolvidas em ondas chave. O drama de cada uma delas foi sair dum tubo que parecia límpido e certo.
Cada um deles saiu do mar com a frustração maior de não ter feito o que fazem a toda hora, sair do tubo.
Todos tem intimidade suficiente com a situação, Alejo provavelmente com Palmas, Bruno com Itacoatiara, Raoni com Itaúna, Miguel com Maresias e Jadson, arrisco dizer, Lajinha da Pipa.
Perder sempre dói, mas doeu mais perder em ondas como aquelas.
Medina foi outra história. Pareceu-me excesso de confiança, natural num menino que nem faz uma semana estava celebrando seu primeiro título e dominou completamente sua bateria na primeira fase contra surfistas supostamente mais fortes nessas condições do que Chris Davidson.

Produzido e engarrafado em Peniche

A intensidade desses três dias foi algo de se parar e pensar.
O circuito não aguentaria mais de um evento desses.
Os nervos ficam todos à flor da pele e as coisas acontecem numa velocidade tão grande que quando paramos pra pensar no absurdo que foi a bateria anterior, na seguinte já se desfralda algo ainda mais impressionante.
Quer exemplos?
Owen versus John Florence. Fanning x Bede, Kai x Julian, Freddy x Michel, Bede x Florence, todas disputas com pontuações acima de 17. Os perdedores dessas baterias ganhariam a maioria dos eventos do circuito no resto mundo.
Para comparar, foram 9 pontuações acima de 17 em Teahupoo contra 18 em Peniche.
Continuemos com o exercício…
Acima de 18 pontos, ou seja, no mínimo duas notas acima de 9 pontos, foram 5 em Peniche contra 4 do Tahiti.
Mais? 19 pontos, 4 de Portugal, 3 do Tahiti.
Reconheço que faltou um 20 perfeito como no Tahiti, mas Teahupoo é uma dádiva da natureza, bancada de coral sem defeito, premiada com o swell da década.
Basta dessa masturbação estatística.

O sofrimento é o intervalo entre duas felicidades
Vinicius de Moraes

Outubro foi o mês da sorte pros brasileiros. Precisamos de mais eventos em outubro. Fui gentilmente convidado pela Fuel TV e Rip Curl de Portugal para fazer a transmissão em português. Aqui em Portugal deve ser o único lugar do mundo onde o campeonato de surfe é transmitido na íntegra, sem intervalo, desde o inicio até a última bateria num canal de TV pago – além da internet.

Mineiro (foto acima) saiu da bateria contra Travis Logie e foi logo ao webcast conversar conosco, pra nossa surpresa declarou que lesionou seu joelho na segunda feira e foi preciso até uma injeção para aliviar sua dor.
Nada indicava que Adriano carregava uma contusão assim tão grave e olha que existia a possibilidade dele ter que voltar pra água mais, no mínimo, 5 vezes.
E foi o que aconteceu…
Na quarta fase, Mineiro dispensou Bede e Freddy P. Descansou até os caras se matarem na repescagem e enfrentou Michel Bourez numa bateria ao estilo das grandes lutas de boxe, com troca franca de hostilidades, como diria Nuno Jonet, com direito até a uma nota 10 do brasileiro pra delírio da torcida na praia. Bede seria o próximo adversário, um dos mais perigosos em Peniche, também dono dum 10, o primeiro do evento numa bateria contra Mick Fanning, que pode ser considerada uma das melhores do ano.
Bede tem sintonia com essa onda, já fez um 10 em 2009 e só não arrastou porque Michael Eugene Fanning vinha numa daquelas corridas alucinadas que resulta em título mundial.
Mineiro ignorou a intimidade do Bede com a onda, surfou decidido e concentrado na final contra o Careca.
Pronto, mencionei o Careca… Slater foi o surfista do campeonato, só não fez chover, nem venceu porque esse privilégio seria do camarada que ele mais odeia perder.

Quando entraram para a final, Mineiro e Slater tinham contas a acertar.
Slater perdera de forma humilhante em Bells nas melhores ondas que tivemos até Teahupoo. Em Trestles, todos viram, Mineiro vigorosamente lembrou ao Careca que todos ali marcam e disputam ondas quando têm pontos em jogo. O que pode ter parecido uma afronta por parte do Mineiro é o que alimenta as grandes rivalidades e deixa nosso esporte mais fascinante e humano.
Se Andy conseguia não apenas superar Slater dentro d’água, mas também entrar literalmente dentro da cabeça do Careca para desmontar seus esquemas mentais, Mineiro consegue o desestabilizar completamente.
O mesmo bloqueio que Slater impõe aos outros competidores, Adriano usa contra ele.
Existe ali uma tensão não dita e não escrita que extrapola o que acontece dentro do mar.
Nunca vi Slater tão visivelmente constrangido como no pódio em Supertubos.

O triunfo do Mineiro foi definitivo e avassalador, ainda maior do que Medina na França.
O Brasil entra agora numa nova fase do surfe profissional.
Mineiro tem duas vitórias, Medina uma, Jadson venceu ano passado, Heitor passa por uma fase tão fantástica que só é ligeiramente ofuscada por essas conquistas como a do Mineiro ou Medina.
Alejo parece fadado ao sucesso breve, assim como Miguel.
Temos Jesse e Camarão chegando em velocidade alucinante, Willian Cardoso colado a beira dum colapso e Junior, Guigui, Hizu…

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