Os RTMF homenagearam Ricardo dos Santos durante o Mundial de Bowl em Madureira. Da esq. à dir.: Pedro Barros, Vi Kakinho, Murilo Peres e Felipe Foguinho.
O skatista catarinense, que completa 20 anos neste mês (dia 16/03/2015), já começou a caminhada para o sexto título mundial de bowl. Em Madureira, no Rio de Janeiro, ele venceu o primeiro campeonato do ano: o Oi Bowl Jam. Ao comemorar o título, ainda na pista, Pedro protestou em rede nacional: “Esta aqui foi em homenagem ao Ricardinho, grande amigo meu. Só quero que o Brasil faça justiça”. Ao seu lado, estavam Murilo Peres, Vi Kakinho e Felipe Foguinho, membros do Rio Tavares Mother Fuckers – ou simplesmente RTMF –, um grupo de fissurados por surf e skate. Os quatro vestiam camisetas brancas com homenagens a Ricardo dos Santos, cinco dias após a morte do tuberider. Entre os temas da entrevista a seguir, Pedro Barros fala sobre a relação com Ricardinho, os problemas de Floripa, sua terceira temporada havaiana e semelhanças e diferenças entre o atual momento do surf e do skate brasileiro.
Por Kevin Damasio
Além do skate, Pedro Barros é fissurado em pegar onda. Na foto, ele arrebenta o lip de Uluwatu, na trip para a Indonésia que fez em 2013.
HARDCORE: Como era sua relação com o Ricardinho? E a do RTMF com ele?
PEDRO: A gente aqui sempre teve uma conexão forte do surf com o skate. O respeito como profissional existe há anos entre nós – principalmente por sermos de Santa Catarina. Não tínhamos muita convivência, mas, como falei, era uma ligação forte. Quando dava, estávamos em algum lugar fazendo algo. A última vez em que estivemos juntos foi no Hawaii, no final de 2014. Lá, fiz um churrasco em casa só para os íntimos. Foi uma noite irada! Até agora nem acredito no que aconteceu!
Sabemos que a impunidade impera no Brasil. É algo que você vê muito na Grande Florianópolis?
Cara, o Brasil inteiro está podre! Temos uma polícia corrupta, sem o menor caráter. A segurança está sinistra! Morre mais gente no Brasil por homicídio do que em uma guerra. E o pior é que estamos nos acostumando com isso.
Sempre que possível, você aproveita a grande exposição para protestar – isso aconteceu em Madureira, em rede nacional, quando você cobrou justiça com o caso do Ricardinho. Qual é a importância dessa pressão?
O principal objetivo é aproveitar uma pessoa que tem fama para expor uma necessidade de todos. Aproveitar a mídia por trás e, assim, alcançar a opinião pública. O caso do Ricardinho não é o único, mas foi um bom exemplo para pressionar as autoridades.
Na entrevista que fizemos no ano passado, falamos sobre Florianópolis e você disse: “Se não houver um planejamento muito bem feito, a cidade vai afundar”. Quais são os principais problemas que Floripa enfrenta hoje?
Não sou a pessoa certa pra falar sobre isso – meu pai é mais encabeçado nessas questões que eu, mas com certeza o maior problema de Floripa hoje é a segurança pública e as obras de urbanização, desenfreadas e de péssimo gosto. As organizações tentam ajudar, mas esbarram na corrupção e na ditadura em que vivemos!
O maior problema de Floripa hoje é a segurança pública e as obras de urbanização, desenfreadas e de péssimo gosto. As organizações tentam ajudar, mas esbarram na corrupção e na ditadura em que vivemos.
Desde a nossa conversa, em abril, até hoje, algo mudou politicamente nessas questões?
A única coisa boa que aconteceu até agora, que seja notável, foi o fato de o prefeito e o secretário de obras finalmente terem entendido que o skate é importante para a cidade. Eles iniciaram a obra de uma pista decente na Costeira. Entenderam que o skate, como todo esporte muda a característica de um povo. Percebi também outras obras de benefício público, mas a segurança ainda é um fator foda! Eu tenho que viver, e a cidade tem que me garantir esse direito.
A comoção que envolveu o assassinato do Ricardinho mostrou como somos unidos (surf, skate e até comunidades do litoral) não apenas nos esportes. Como você percebe essa união?
Cresci num meio em que o surf e o skate vivem juntos. Sei que na década anterior era diferente, mas eu ainda era muito criança para notar isso. De fato, estamos unidos e isso é muito importante, pois somar é sempre o melhor caminho. O surf e o skate têm como sua maior essência o lifestyle – e são muito parecidos. Complementam-se tanto no estilo de vida como no esporte em si. É perfeito.
Gunzeiras a postos no North Shore, temporada 2014-15. Alex Chacon, Ian Gouveia, Pedro Barros, Yago Dora e Caio Faria.
Nesta temporada havaiana, ficou ainda mais evidente essa união. Direto você estava com o Ian Gouveia, o Yago Dora, o Alex Chacon. Como foi essa trip em Oahu?
Cara, foi muito animal. Na outra vez que fui para o North Shore para surfar, em 2005, eu era muito moleque. Depois, no mesmo ano, fui para o Kauai para correr um campeonato de surf – ainda tive a sorte de sair na revista Surfer, junto com os irmãos Irons; mas não me lembro a colocação em que fiquei. Em 2013, fui com a equipe da Volcom para filmar sessões de skate, então quase não deu para surfar. E teve essa temporada de agora. Estou cabaço ainda (risos), mas essa última foi a melhor, disparado. Pô, a gente nunca tem como passar muito tempo junto. Eu viajo o ano inteiro, e eles também. Agora temos alguns picos em comum. O Hawaii, a Califórnia durante o US Open; e Manly no Australian Open. Nesses eventos, sempre surfamos e andamos de skate juntos. Nessa temporada no Hawaii, o mar estava gigante quase o tempo todo. Então fugi para o West Side várias vezes, enquanto os moleques treinavam nas ondas de verdade. Fizemos muita bagunça juntos. Caí uma vez em Waimea – tinha uns 10 pés. Meu pai amarelou, mas eu fui (risos). Os moleques me botaram mó pilha e aí não quis perder a chance. Acho que ganhei a bateria (risos) – mentira, eles são muito sinistros. Sou fã de todos.
No North Shore, o pentacampeão mundial de bowl fez uma sessão com o havaiano John John Florence.
Você também fez sessões de skate no Hawaii, inclusive com o John John Florence. O que você acha das pistas?
O Hawaii está no caminho certo. Aliás, sempre esteve. A pista pública não é nada de super especial, mas é irada. A nova geração está vindo com tudo, e muitos deles surfam e andam de skate. O John John e o Kalani David são exemplos fortes – andam muito e surfam muito mais. Fizemos algumas sessões. Uma com Kalani, e outra com o John John. As duas foram rápidas, mas valeu pelo feeling. Com o John John, foi legal o fato de ele ter adorado a Lay Back Beer (cerveja lançada pelo André Barros, pai do Pedro), ter feito várias fotos e ainda ter pedido para colocá-las no programa que ele está fazendo. Fiquei amarradão com a moral que ele me deu, de forma muito natural.
Pedro ao lado de Alexandra Florence mãe de John John, e do skatista Greyson Fletcher, filho de Christian, durante a temporada havaiana.
Na virada do ano, você estava com o Gabriel Medina na Praia do Rosa. Como é a relação entre vocês?
A gente sempre teve uma conexão pelo surf, pelo skate e pelo que somos na cena, mas nunca havíamos nos encontrado. Eu sou muito amigo do Thiago Camarão, que é muito amigo do Medina. Aí rolou a ideia de fazermos um fim de ano juntos. Eu o conheci no Hawaii. Foi foda vê-lo ganhar o título! Muito orgulho de ver isso acontecendo para o Brasil. Já o vi surfar, e ele já me viu andar de skate, mas tanto o mar no Hawaii estava foda para mim, como o bowl estava muito grande para ele, então valeu mais ficar assistindo.
Como o surf e o skate profissional brasileiro se assemelham atualmente? E em que aspectos se distanciam?
O skate brasileiro domina os campeonatos mundiais. Temos realmente essa vantagem. Por outro lado, o skate ainda não está organizado como o surf. A nova geração de surfistas já está sendo criada em condições mais parecidas com as dos gringos, viajando mais tempo desde cedo. Nisso o skatista leva vantagem, porque no Brasil aprendemos a andar de skate em picos cascas-grossas e depois vamos competir em lugares fáceis. Já o surf no Brasil não é constantemente casca-grossa e nem de qualidade internacional – isso diferencia no circuito.
Esta entrevista foi publicada originalmente na HARDCORE 304, de março de 2015.