Por Eric Freitas Mazzei
Fotos: Diego Luis e Marcelo Nalu
* Foto de abertura: Marcelo Nalu
Eric Mazzei, surfista e oceanógrafo (e o autor deste texto), integra o grupo de surfistas que foi o último a desfrutar da perfeição das ondas de Regência – em um mar clássico, diga-se. Abaixo, você confere seu texto sobre a última session e suas palavras sobre as principais consequências para o pico que foi a meca do surf capixaba:
Na manhã de sábado (21), na vila de Regência Augusta (ES), na foz do rio Doce, fizemos uma session de surf inusitada. A última antes da chegada da lama tóxica, que veio descendo o rio Doce desde Mariana (MG).
Paraíso turístico, por suas belezas cênicas naturais e culturais, ícone maior do surf capixaba e lenda no cenário nacional, que a cada dia se tornava conhecida mundialmente pela qualidade das maravilhosas ondas tubulares dos points e extensos e perfeitos braços da boca do rio.

Nesta última session, poucas pessoas acreditaram no pequeno balanço de sudeste que constava na previsão após alguns dias de ondulação de nordeste de meio metrinho. Resultado: mar sem crowd e belos tubos de 1,5 m, os últimos antes do fim. A galera dentro d’água sentia-se honrada por aquele presente inusitado. Regência mais uma vez demonstrava toda sua fonte de vida, alegria e felicidade a nós que necessitamos deste contato diário com a natureza divina.
A chegada deste rejeito da mineração trouxe impactos socioambientais sem precedentes em nossa história. De longe a maior catástrofe que presenciamos neste século e potencialmente o maior de todos os tempos de nosso país e quem sabe do mundo inteiro!

Para uma rápida ideia, elenco apenas três consequências terríveis:
– Biomagnificação trófica causa: contato direto e indireto com a toxicidade (metais pesados rejeitos do processo de mineração, como mercúrio e arsênico). Consequência: envenenamento e morte da fauna e flora, com perda total da biodiversidade, seus bens e serviços ambientais (ex: equilíbrio natural da cadeia alimentar, água limpa, lazer, acesso aos recursos naturais,) essenciais a manutenção da vida humana.
Ainda moribundos em vida, os seres humanos daqui passam por terríveis momentos em um panorama de envenenamento a médio e longo prazo. Estes metais pesados atuam diretamente nas ações enzimáticas das proteínas de nosso corpo, afetando os sistemas gastrointestinal, neurológico central e periférico, hepático e renal, além de serem cancerígenos;

– Destruição do modo de vida das pessoas que habitam a região, com impedimento de usufruto básico dos ambientes e acesso aos recursos naturais essenciais como a água, tanto para lazer quanto para sobrevivência e trabalho;
– Destruição da economia local, com declínio das atividades essenciais: o extrativismo dos recursos naturais e principalmente o turismo. Vergonha pensar que todos esses resultados terríveis poderiam ter sido evitados.

Hoje o sentimento de todos é tristeza, indignação e vergonha destes tempos de terrorismo socioambiental nacional! Mas a natureza é plena e vai um dia recuperar-se desta falta de amor. Esta é a energia que ainda nos motiva a resistir por aqui na foz tóxica do rio de lama, que um dia foi o nosso doce paraíso… MUDA SER!
#REGENCIAVIVA @BocanaSurfCamp