Andrea Moller é uma waterwoman completa. A brasileira, nascida em 1979, cresceu em Ilhabela, litoral paulista, e mora em Maui há muitos anos. Experiente windsurfista, canoísta e big rider que divide a rotina entre a profissão (Andrea é paramédica), as ondas grandes, os treinos e as corridas de canoa havaiana, Andrea foi uma das primeiras mulheres a remar nas ondas de Pe’ahi, lá em 2004.
No dia 28/01 desse ano, a surfista escreveu seu nome na história do big surf feminino (foto abaixo). Pegou uma onda gigante em Pe’ahi, que muitos dizem ser a maior onda já surfada na remada por uma mulher. Quase duas semanas depois do feito, a surfista passou por um experiência traumática – e sofreu, segundo ela mesma, a pior lesão da sua carreira de atleta. Passou por cirurgia e desde então segue sua recuperação.
Abaixo você confere as palavras de Andrea sobre o 11 de fevereiro:
O último inverno foi um dos melhores dos últimos anos. Vários swells gigantes com boas condições de tempo. Jaws quebrou com freqüência, quase todas as semanas, com pouco vento e de tamanho perfeito. No dia que eu me machuquei, tinha acabado de sair do trabalho. Acordei 5:30h esperando o outro paramédico entrar para eu sair. Geralmente faço turno de 48 horas direto. Nesse turno, meu amigo paramédico me cobriu por 6 horas no dia anterior e voltou de manhãzinha para eu surfar novamente. Ele sabia que o swell acabaria naquele dia, e queria que eu tivesse a oportunidade de surfar Jaws enquanto estava quebrando. Então terminei o plantão noturno e fui surfar.
Eu tinha todo o equipamento pronto comigo. Dirigi direto para Maliko. Coloquei meu wetsuit, preparei meu “inflatable vest”, peguei a prancha e esperei o time chegar. Nesse dia éramos em cinco; Yuri Soledade, Danilo Couto, Chuck Patterson e Kaipo Soledade (filho do Yuri), e eu. O Kaipo faz parte do Skullbase, o grupo de salva-vidas que fazem resgates em Jaws voluntariamente. Ele sempre nos dá maior apoio dentro e fora d’água.
Nós saímos de Maliko 6:30h da manhã, com dois jet skis e nossas pranchas. Chegamos em Jaws e passamos alguns minutos olhando as ondas. Sempre observamos, analisamos a direção das ondas, as condições do mar, e sentimos a energia de Pe’ahi. O crowd estava tranquilo pois muitos surfistas ainda não tinham voltado da cerimônia do Eddie Aikau – aquele primeiro que não rolou. Esperava um dia perfeito para cair na remada – e com menos gente.
Olhei algumas séries e decidi cair. A maioria das ondas tinha tamanho médio/grande; também vinham outras gigantes, quase insurfáveis. Esperei mais ou menos por uma hora, sem pegar nenhuma onda. Lembro de ficar junto de Danilo e Shane Dorian e receber dicas deles. Shane acabava de ver eu remando forte para uma onda sem conseguir entrar nela. Ele deu dicas e ficou ali comigo. Os dois sentaram nas suas pranchas e esperaram a próxima série. A primeira onda passou. Não estávamos interessados. A segunda veio bem. Fez o pico lá fora e começou a se formar para a nossa direção. Deitei na prancha, me direcionei, e comecei a remar. Shane disse “Go Andrea, go!”. Danilo gritou! E quando o Danilo grita “ vai !!!”, significa coloca para baixo mesmo! Fui.
Coloquei a prancha no pé e senti que seria um drop aéreo. Voei mas completei. Poucos segundos depois, um “bump” na face da onda me tirou do ritmo. O bico da prancha bateu na água e me desequilibrou. Neste momento eu estava na base da onda tentando fazer o bottom turn, mas não consegui virar a prancha, muito menos ficar em cima dela. Assim que caí na água o lip bateu nas minhas costas. Minha perna direita foi puxada na direção oposta, foi muita pressão e deu no que deu. Senti uma dor intensa e imediata, mas não sabia que tinha me machucado tanto. Era como se a minha perna tivesse se separado do meu corpo, mas a princípio, conseguia me mover sem muita dificuldade.
O Nano Messera vez o resgate. Ele também faz parte do grupo Skullbase. O Kaipo viu o Nano me pegar e ficou para segundo apoio se necessário. Segurei no sled apenas por alguns segundos, pois a prancha ainda estava presa no leash da minha perna machucada. A dor protestou. Soltei do jet. Tirei o leash, tomei uma onda na cabeça e esperei o Nano voltar. Subi no jet e sentei atrás dele, mas não saíam palavras. Respirei forte. A dor era imensa. Me apoiava na perna esquerda para tirar o peso da direita. Aos poucos a dor foi indo embora. Nós fomos para o canal e aguardamos alguns minutos.
Na série seguinte o Yuri pegou uma onda tubular linda e Kaipo foi ao seu resgate. Os dois voltaram para o canal e vieram falar comigo. Yuri olhou para mim com cara quem me conhece mais do que eu esperava. Ele é como um “coach” para mim, vem me treinando por muitos anos desde quando comecei a surfar Jaws, em 2004. Ele perguntou se eu estava bem. Disse que “sim”, mas ele sentia minha dor. Eu sorria, mas por dentro chorava. Yuri sabia disso. Dali em diante a missão foi voltar para casa e descobrir que nem todos os dias acabam do jeito que a gente espera. Fui para o Hospital e descobri que a lesão era real. Passamos alguns dias fazendo exames que relataram que os músculos de trás da minha perna foram rompidos e arrebentados do osso do quadril. Os médicos olhavam para mim com pena, pois sabiam que cirurgia era a única escolha.
Foi a pior lesão da minha carreira de atleta. Estou aprendendo a ser paciente e mantendo a mente positiva. Surfar ondas gigantes significa se colocar em risco; agradeço por nunca ter me machucado antes. Vou guardar este inverno no meu coração com boas lembranças das melhores ondas da minha vida. Agradeço a Deus por não ter sido mais grave. Minha família e amigos têm me ajudado muito desde o meu acidente. Não imagino passar por isso sem o carinho deles. Tenho fé que tudo vai dar certo. Queria agradecer a todos por todo o apoio.