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Lição de Bethany Hamilton

 

Por Manuela D’Almeida

Tive a oportunidade de cruzar Bethany Hamilton duas vezes na minha vida. Em ambas, não consegui abordá-la e ter a chance de trocar algumas palavras. A primeira vez foi em 2008 quando estava saindo de Pipeline com a minha mochila de equipamentos nas costas. Quando cruzei a ciclovia, eu a vi passar pedalando bem equilibrada segurando o guidão da bicicleta com seu único braço.

A segunda vez que cruzei Bethany foi dentro do mar, na onda de Waikokos, em Hanalei Bay, North Shore do Kauai. Eu já a tinha avistado surfando enquanto alongava na areia. Em seguida, fui entrando no point um pouco tensa, pois era a minha primeira vez no lugar e eu estava sozinha. Na sequência, acabei fazendo amizade com um surfista local que me ajudou a entrar na água. Quando eu estava mais relaxada, vi Bethany pegar uma onda e sair da água. Lá se ia mais uma oportunidade de conhecer esta surfista tão excepcional. No outside, havia mais algumas meninas, entre elas Alana Blanchard. Foi muito legal surfar aquela onda incrível e ainda dividir o lineup com jovens lendas do surf feminino.

Alana ainda continuou aproveitando aquelas ondas por um bom tempo. Eu a vi rasgar uma delas com pressão e espirrar água em quem remava de volta ao outside. Fiquei orgulhosa de ver uma mulher surfar daquela maneira. Nos dias seguintes conheci todo o North Shore do Kauai e passei pela onda de Tunnels, local em que o tubarão arrancou o braço de Bethany. A onda encontra-se bem afastada da areia assim como vários outros picos de onda do Kauai. Senti um arrepio ao imaginar seu membro sendo devorado, o sangue se espalhando e Alana e sua família tendo que dar um jeito de tirá-la da água com o tubarão ainda rondando a área. Com certeza, o pai da Alana teve um papel crucial no resgate de Bethany. Se ele não tivesse agido tão rápido, certamente ela não teria sobrevivido. Ainda mais no Kauai, onde o hospital fica, a pelo menos, 30 minutos de distância da onda Tunnels, e esta quebra a uns 20 minutos de remada da areia.


Bethany rasgando no Hawaii. Foto divulgação.

Eu sempre tive curiosidade de ler seu livro autobiográfico e, principalmente, ver sua história contada por Hollywood no filme Soul Surfer – Coragem de viver, que teve lançamento mundial no início do ano. Mas depois de conhecer o Kauai, me familiarizar com o estilo de vida da região e ver Bethany e Alana surfando juntas, fiquei muito intrigada em saber mais de sua vida. Confesso que com o frenesi da mídia em ver os acontecimentos de sua vida serem contados tantas vezes, pensei que não teria novidade alguma ao ler o livro e assistir ao filme. Achei que ela descreveria o acidente e faria uma espécie de catequese chata.

Lendo as páginas do livro e, principalmente, vendo as imagens do filme, senti vergonha de ter feito esse pré julgamento. As cenas de Soul Surfer são muito tocantes. É claro que existem clichês de Hollywood; é claro que não é um filme de ação. No entanto, é possível ver como Bethany teve uma força sobre-humana para superar um trauma devastador. E mais, usou esta tragédia para passar uma mensagem de esperança e fé para os quatro cantos do mundo. Foi surpreendentemente forte em um momento em que qualquer pessoa “comum” teria tendência a fraquejar e simplesmente, desistir de tudo.

Como a havaiana é uma pessoa tão tímida e humilde, ao ler o livro não temos a real sensação da complexidade do sofrimento que ela passou e toda a força de vontade que precisou ter para conseguir voltar para a água. No livro, a linguagem dela é de aceitação, vendo sempre o lado positivo e tendo a fé obstinada em Jesus Cristo. Já no filme, os atores buscaram o máximo de realismo. Por alguns instantes, somos transportados ao dia do acidente e à recuperação no hospital. Esse realismo não é sentido apenas no momento da tragédia, mas também quando uma Bethany amputada visita a Tailândia e ajuda crianças sofridas pela tragédia do tsunami fazerem as pazes com o mar.

No final do filme, é mostrada uma sequência de imagens da Bethany “verdadeira” enfrentando todas essas adversidades. Nesse momento, percebemos que os fatos mais importantes do filme são mesmo reais. Essa doce surfista atualmente participa do Circuito Mundial, disputando de igual para igual com as demais competidoras e, ainda, dedica sua vida em prol do próximo. Sua principal atividade nas ONGs Friends of Bethany e World Vision é passar a alegria de viver a pessoas que também sofreram traumas e tiveram membros amputados. Além de ajudar a arrecadar fundos e dar atenção para essas pessoas, a havaiana levaos para o mar e ensina como pode ser transformadora a sensação de dançar sobre a água.

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