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Lucas Silveira: Entrevista e prancha mágica

Por Kevin Damasio | Publicado na HARDCORE #315 (março de 2016)

No dia 13 de janeiro, Lucas Silveira conquistou o mundo nas direitas de Ribeira D’Ilhas, Portugal. Aos 19 anos, o carioca sagrou-se campeão mundial pro júnior, com um desempenho impecável durante o evento em Ericeira.
Contra adversários difíceis, somou high score atrás de high score em todas as baterias e garantiu o título ante Timothee Bisso, da caribenha ilha de Guadalupe. Além do troféu, Lucas garantiu sua vaga para disputar todas as etapas de nível 10.000 do QS 2016. O caminho até a glória, contudo, foi árduo. Sem desempenhos consistentes, ele terminou 2015 em 104º no ranking do QS, mas manteve a regularidade nos eventos regionais do Pro Júnior, classificou-se para a etapa do Mundial da categoria e desbancou favoritos até sacramentar a maior conquista da carreira até agora.

Na entrevista a seguir, Lucas Silveira revela as mudanças ao longo da temporada, revive o campeonato inesquecível em águas portuguesas e garante que se sente preparado para alcançar seu próximo objetivo: integrar o time brasileiro na elite mundial.

Lucas Silveira em Off The Wall, Hawaii, em janeiro, após a conquista do título mundial pro júnior. Foto: Pinguim
Lucas Silveira em Off The Wall, Hawaii, em janeiro, após a conquista do título mundial pro júnior. Foto: Pinguim

Em Ericeira, você quebrou em todas as baterias. Como chegou a tal performance?
Mudei meu pensamento, fiquei mais confiante. Acreditei. Botei na cabeça que ganharia e consegui me conectar muito com o lugar. Para ir bem em um campeonato, acho que o mais importante é ficar bem consigo. O físico todo mundo tem em comum, então o mental e o espiritual são os diferenciais.

Você trabalhou isso ao longo da temporada?
Acho que veio naturalmente. Minhas experiências e aprendizados, não só durante o ano, mas durante a vida inteira, me indicaram o caminho. Nas baterias, tudo dava certo. Já tinha surfado em Ribeira D’Ilhas. A onda com certeza encaixa bem no meu surf. Mas o campeonato começou em outra praia, numa onda bem ruinzinha. Eu só reclamava: ‘Pô, não vai ser a bateria que a gente esperava.’ Mas o Grilo [Leandro Dora], meu treinador, botou na minha cabeça que eu estava surfando muito bem e tinha condição de ganhar em qualquer praia que fosse. ‘Pensa no teu objetivo final. O caminho é impossível prever, então tem que estar pronto para qualquer situação.’ Com isso, parei de reclamar e apenas visualizei que eu seria o campeão mundial.

Qual foi o papel do Grilo (Leandro Dora) nessa conquista?
Ele me ajudou muito na parte técnica e no preparo psicológico – como fez com o Mineiro, no título mundial. Comigo também estavam o Yago Dora, filho do Grilo, o Alcides Lopes e o Marcelo Amaral, fisioterapeuta e responsável por minha parte física. A equipe estava conectada. Ficamos no hostel de uma família portuguesa muito gente boa. Isso ajudou bastante.

O título mundial do Mineiro, com grande participação do Grilo, te deu mais confiança?
Acho que sim. O Brasil ganhou tudo da WSL que podia no ano passado. O Mundial Júnior era o único título que faltava, e isso foi uma instigação a mais para mim. Todo mundo torcia muito e essa pilha extra aumentou minha confiança. Sendo campeão, o Mineiro mostrou que era possível, que é algo muito grande, mas não é de outro mundo. Nesse convívio, ver como ele compete fez com que eu competisse melhor.

Como o Mineiro te puxou, além da técnica na competição?
Na temporada, a gente se encontrou na Califa e em J-Bay. Já no Hawaii, eu estava na casa com o Grilo, então o Mineiro vinha direto. Foi legal porque, mesmo disputando o título, ele estava descontraído. A gente surfava junto quase todo dia. Ele mostrou que, nessa situação, temos que lidar com o fato de ser campeão como algo normal. Meu pai também falou muito disso para mim: para fazer high score e bateria boa, tem que surfar naturalmente. ‘Mantenha a frieza.’ Consegui usar bastante isso no campeonato, em Ericeira. Fazia nota alta e não deixava isso me abalar: voltava para fazer outra melhor. Ninguém se lembraria que eu fiz um 10 no terceiro round, mas sim de quem ganhou o campeonato. Às vezes, o cara que quebra uma bateria e fica alterado não mantém a concentração para a próxima. Consegui ficar bem frio, sem que as boas performances me atrapalhassem.

Conforme ganhava as baterias, o que passava pela sua cabeça?
Cara, era difícil manter essa frieza, mas tentava fazer isso. Quando passava uma bateria, vinha na cabeça: ‘Estou chegando perto, mais uma só.’ Mas logo eu já recuperava o foco: ‘Calma, uma bateria de cada vez.’ Não deixei que a emoção de se aproximar da final me vencesse.

Em Ericeira, Lucas Silveira ergue a taça do Mundial Pro Júnior, ao lado do vice Tim Bisso. Foto: Poullenot
Em Ericeira, Lucas Silveira ergue a taça do Mundial Pro Júnior, ao lado do vice Tim Bisso. Foto: Poullenot

Como foi o caminho até a final?
Desde o Round 3, quando fiz a nota 10, eu caí com caras que eram favoritos. Todas as baterias foram difíceis, principalmente contra o Kanoa Igarashi. No fim, peguei uma onda sem a prioridade, tirei 9,2 e virei. Cada bateria que passava bem me deixava mais confiante. Na final, na minha cabeça seria impossível não ganhar. ‘É só repetir o que tenho feito.’ O Tim Bisso surfou muito bem durante o campeonato inteiro, mas começou a decisão pegando onda fraca. Eu abri com um 8. Aí ele sempre vinha na ruim e eu na boa. Deu tudo certo.

“O Brasil ganhou tudo da WSL que podia em 2015. O Mundial Júnior era o único título que faltava, e isso foi uma instigação pra mim.”


Quando percebeu que era campeão mundial?

Quando vi a filmagem da hora que ganhei, até achei engraçadas as minhas reações. No dia seguinte, durante o voo para o Hawaii, lembrava das coisas e começava a rir sozinho. A ficha foi caindo aos poucos. O mais legal foi a sensação de alívio logo que acabou a final. Veio na cabeça que tudo que eu achava que tinha sido ruim aconteceu para ligar àquele momento. Quando cheguei no hotel, um bombardeio de mensagens. Às vezes me esquecia do que tinha acontecido, pensava em outra coisa, mas logo lembrava do título e ria à toa: ‘Caramba, o que eu fiz aqui?’

Ver o CT dominado por brasileiros vai te influenciar ao longo dessa temporada?
O plano esse ano é ir com tudo no QS, para me classificar para o CT. Os brasileiros que estão ali são meus amigos. Vê-los me faz querer ainda mais fazer parte disso. O fato de o Brasil estar no melhor momento que já teve só ajuda. Se tudo der certo, ano que vem terão mais alguns ali – e espero ser um deles.

Seu surf é bem completo: power, tubo, aéreo. Já se sente preparado para disputar o CT?
O que mais tenho focado em melhorar é surfar bem nas ondas ruins e na marola. Evolui bastante nesse aspecto, que é muito importante para o QS. Eu me vejo bem completo mesmo. Desde pequeno, sempre falei que queria surfar bem em qualquer condição, de 1 a 30 pés, e estou chegando perto desse objetivo.

No Tour, onde tem mais vontade de competir?
Fiji, Teahupo’o e J-Bay. Fiji não só pelos tubos; quando está menor, o pico é muito bom de manobra, e gosto bastante de surfar onda forte de backside. Teahupo’o é por causa dos tubos, e J-Bay porque é J-Bay. Precisei melhorar nas ondas do Brasil. O que normalmente os brasileiros têm de ponto forte, eu tinha de ponto fraco. Mas o fato de viajar para fora desde cedo e o gosto por esse tipo de onda, se classificar, vai ajudar bastante a me adaptar ao CT.

Como avalia sua experiência em Pipe?
Já surfei em Pipe na minha primeira temporada, com 11 para 12 anos. Ficava no canal, fazia uns tubinhos. A cada ano, ia mais para o pico, até que fiquei bem à vontade. O que percebi é que competir lá é muito diferente do freesurf. Corri alguns campeonatos com a mentalidade de pegar o tubão nota 10. Mas percebi que, na verdade, precisa entrar na água para passar bateria. Quem faz isso muito bem é o Medina. Ele entra e pega a onda certa, não precisa se arriscar mais. É uma onda boa, mas muito difícil de competir.

Sempre quis ser competidor, ou por viajar tanto chegou a balançar para o freesurf?
Sempre quis competir, mas gosto de fazer os dois. Numa época em que perdia um campeonato atrás do outro, eu pensava: ‘Chega disso.’ Pensei em só pegar onda grande, mas era um pouco da frustração do momento. Meu maior sonho é o título mundial, mas uma coisa de cada vez. Primeiro, focar em entrar. Quando entrar, traçar os planos para brigar pelo título. HC

Prancha Mágica

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“A Driver é uma prancha versátil, de ótima adaptação. Anda muito bem por seções mais deitadas e propõe o espanco quando a parede fica vertical com o lip quadrado,” conta Lucas. Foto: Pinguim

 
SHAPER: MATT BIOLOS …Lost Surfboards by MAYHEM – Califórnia, EUA – @mayhemb3_mattbiollos
lostsurfboards.net / No Brasil: surface.com.br
MODELO:  The Driver
MEDIDAS: 6’1’’; 18,88; 2,40 e 29,07 litros
RABETA: Squash
QUILHAS: FUTURES fins(AM2)

Tenho usado bastante as pranchas do Mayhem, da Califórnia. Ele tem me dado muita atenção, testei vários modelos no ano passado. Agora, já sei quais gosto, e ele também. São três que uso: um para marola, um para o dia a dia e outro para onda boa – o Driver, que usei em Ericeira. Normalmente uso 6’0, mas dessa vez surfei com uma polegada maior. A prancha ficou perfeita para Ribeira D’Ilhas, um pointbreak de direita. Fazia a curva que queria em qualquer lugar da onda. Já tinha achado ela muito boa. Tem muito drive e corta a água muito bem, então facilita em dar rasgadas bem grandes e abertas, com bastante borda – o que os juízes valorizaram lá –, além de responder rápido a tudo que eu queria fazer. A Driver é uma prancha versátil, de ótima adaptação. Anda muito bem por seções mais deitadas e propõe o espanco quando a parede fica vertical com o lip quadrado. O pouco rocker no bico fica plano no meio e voltar a puxar entre as quilhas e rabeta, o que deixa a prancha muito veloz nas partes críticas da onda. Prancha ótima de remada, que acredito para ondas de até 6 pés. O principal motivo – e a prova – de ser mágica, é por que fui campeão mundial com ela.”

 

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